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domingo, 6 de novembro de 2016

MEU REVIEW SUPREMO DE DIVINITY: ORIGINAL SIN























Eu sei, todo Review Supremo deve contar com uma historinha chata pra servir de preliminares a um texto quilométrico que vai exigir duas horas do seu dia pra ser lido por completo. Mas com Divinity: Original Sin a história é diferente.
Eu não vou contar nenhuma historinha chata porque não existe nada pra contar: eu simplesmente vi a capa do jogo em lojas de games, percebi que ele havia ganhado vários prêmios, assisti a alguns vídeos de gameplay e decidi apostar na compra, pra ver se valia a pena.

Se duvida da minha conclusão, as palavras “review” e “supremo” podem dar uma pista do meu veredito sobre esse jogo. Sem mais delongas, vamos começar, pra terminar logo e largar mais cedo. Bem-vindos ao Meu Review Supremo de Divinity: Original Sin Enhanced Edition.



ENREDO



O enredo do jogo gira em torno de dois Source Hunters criados por você, na tela de início. Ele fala sobre uma força maligna conhecida por Source, que é a magia que já conhecemos, só que com outro nome, e que serve de combustível aos magos desse universo. Logo de cara dá pra notar que toda a trama é focada em magos e nas consequências do uso de mágica. O sistema do jogo até tenta disfarçar, disponibilizando algumas classes típicas de RPGs, como arqueiro ou guerreiro, mas não se engane: este palco foi montado para contar uma história de magia, e das boas. E acho que não preciso dizer o quanto isso me agrada no enredo de um jogo...

A história começa na cidade de Cyseal, com dois caçadores de Source investigando um assassinato. Cyseal é uma pequena cidade que se encontra sitiada por um insistente exército de Orcs que aporta na costa da cidade. Pra piorar, há uma intensa atividade de necromantes, que insistem em fazer os mortos se levantarem de suas tumbas, tornando as viagens além dos portões da cidade uma ousadia para poucos (o nível de dificuldade do jogo faz questão de explicitar o quão louca é a sua decisão de se arriscar fora da segurança dos muros do lugar).

Cyseal, fácil fácil, é uma das cidades iniciais com o maior número de quests que eu já vim num RPG clássico. E olhe que estou colocando nessa conta a cidade imperial de Oblivion. Não estranhe se passar suas primeiras dez horas de jogo vasculhando cada cantinho em busca de quests e histórias para registrar em seu diário.

Esse Void Dragon é do mal...

A história de Divinity é muito boa, principalmente levando em conta o fator originalidade. Mas o problema é que, mesmo pra um RPG, o jogo apresenta um excesso de diálogos que pode afastar uma parcela de jogadores menos pacientes, ou fazê-los simplesmente pressionar o botão de cancelar como se seus batimentos cardíacos dependessem disso. Definitivamente, não é um jogo pra quem não tem paciência de ler.
Como se o problema do excesso não bastasse, as legendas são um pouco pequenas, detalhe que certamente vai obrigar os jogadores com visão menos privilegiada a jogar mais próximo da tela da TV (ou dar aquela encurvada legal de coluna, caso esteja na frente do PC).

Os fiéis leitores do blog sabem como eu não gosto de detalhar enredo num jogo, principalmente um RPG. Então, vou partir logo pro principal atrativo que este jogo carrega: seu excelente senso de humor. Eu perdi a conta de quantas referências a outros jogos encontrei ao longo das minhas aventuras no mundo de Rivelon.

Olha o safado aí de novo, se refestelando na imensidão do cosmos.

Se você está antenado com os jogos que marcaram o gênero nos últimos anos, vai reconhecer referências de varrer com rodo a obras como Skyrim (descrição de um balde que pode ser equipado como capacete: “serve pra armazenar fluidos... e cabeças”), O senhor dos Anéis e tantas outras. E isso só pra citar as que minha limitada memória e meu parco currículo de obras desse gênero foram capazes de reconhecer.

Então fica a dica: preste atenção a cada detalhe que encontrar no jogo, seja diálogo, disposição de itens ou um objeto mais diferente. Com certeza isso vai te render umas boas risadas em momentos inesperados.



Personagens



Divinity possui uma gama fantástica, tanto de NPCs quanto de personagens controláveis. Quer dizer, de personagens controláveis não chega a ser uma gama, são apenas quatro (falarei um pouco de cada um individualmente). Mas onde eu quero chegar é que os NPCs presentes no jogo reagem às suas reações de uma forma bem satisfatória, desde o clássico “vou te esfaquear até a morte por ter entrado no meu quarto sem permissão” até o “que coisa feia! Um Source Hunter pegando coisas emprestado da minha loja sem pedir permissão...”

Exemplos da interação proporcionada pelos NPCs: se você violar a tumba de um ente querido de alguém que está por perto, não espere sair do lugar com vida, numa boa.
Os animais do jogo, por sua vez, dão um show à parte. Além de (alguns deles) darem dicas cruciais para a resolução de enigmas, eles trazem vários easter eggs de outros jogos de RPG, fazendo valer aquele pontinho suado que você gastou na Skill Pet Pal.

Não se escandalize ao encontrar vacas falantes, ovelhas deprimidas por servirem apenas como fonte de lã, ou um galo modelo fotográfico que posa para quadros em plena praça de Cyseal. No cemitério da cidade, encontramos um cachorro viciado no cheiro do seu próprio dono, e nas ruas apertadas da “metrópole”, um galo canta em alto e bom som os ideais de Liberdade, Igualdade e Fraternidade da Revolução Francesa. Preciso dizer mais alguma coisa? Então eu digo: NÃO JOGUE SEM O PERK PET PAL. O jogo não terá metade da graça se você cometer esse erro. 


AJUDANTES



















No campo de ajudantes, e dessa vez nada da piadinha de “atrapalhantes”, Divinity traz a menor quantidade de personagens em um RPG que eu joguei nos últimos anos. Que eu tenha descoberto, são apenas quatro. Uma piada de mau gosto, se for comparar aos 13 companions de Fallout 4, por exemplo.

Mas é aí que entra aquela célebre frase: “às vezes, menos pode significar mais”.
Pelo fato de só trazer quatro ajudantes pro seu grupo, foi possível desenvolver diálogos, quests próprias e todo um universo de particularidades e detalhamento que seriam impossíveis de se alcançar se esse número fosse maior.

Cada ajudante tem sua própria quest, classe específica, diálogos exclusivos e localidades a serem visitadas. Mas as particularidades da história de cada um você só vai conhecer ao longo do relacionamento com tal personagem. Nada de cravar o marcador de quest (um recurso inexistente nesse jogo) em um aliado em particular e resolver os seus conflitos de uma tacada só. Funciona mais ou menos como no Fallout New Vegas: o seu parceiro vai liberando informações sobre seus dramas pessoais aos poucos, cabendo a você explorar mais e fazer seu companheiro se abrir com você.

São tantas opções que nem sei quem escolher...

O jogo traz uma mecânica de troca de personagens que não só funciona muito bem, como é extremamente necessária para passar por certos desafios de lógica nas fases.
O melhor exemplo do que estou falando é um par de pirâmides de teleporte que pegamos logo no começo do jogo: se você for mais esperto do que eu, e dominar seu uso nas primeiras horas de jogo, conseguirá se livrar de muita dor de cabeça ao passar por armadilhas, lugares inacessíveis ou que você julgava impossíveis de se alcançar.

E o mais legal nas mecânicas de ajudantes de Divinity é a forma como o jogo faz questão de nos lembrar que não estamos na companhia de bonecos sem vida ou vontade própria. Ele te apresenta elementos de liberdade (uso de itens, troca de personagens, teleportação) e te recompensa pelo seu raciocínio em usar de forma adequada esses elementos pra burlar as intempéries dos cenários, mas também cobra um preço por isso.

Por exemplo: para cruzar certas áreas com armadilhas (os desenvolvedores desse game têm um indiscutível fetiche com armadilhas, isso é fato) eu usava a telecinese para arremessar meus companheiros de um lado a outro do cenário. Alguns deles levam isso de boa, mas Jahan, por exemplo, não gosta nada da ideia de ser feito de bolinha de pingue-pongue nas minhas mãos: orgulhoso que é, na terceira vez que usei esta tática ele simplesmente me deu um baita sermão e ABANDONOU O GRUPO SEM PENSAR DUAS VEZES, algo que condiz 100% com sua personalidade, e que me fez sair correndo pra usar o comando de load game o mais rápido que eu pude (embalado pela trilha sonora das minhas próprias gargalhadas).
Sem mais enrolação vamos à lista de personagens disponíveis no jogo:


GROGNAK E HERMIONE






















É claro que estes personagens não são oficiais. É que o jogo te obriga a criar dois protagonistas do zero, logo no começo de sua jornada. Você pode escolher a classe, sexo (apesar de que eu acho que exista uma obrigatoriedade em você optar por um casal, pelas exigências do enredo) e algumas frescurites de aparência como: rosto, ceroulas, cabelo e cor de pele. Mas se a sua pegada é passar horas criando um personagem que, no final das contas, vai virar uma caricatura horrenda de você mesmo, nem se anime: as opções de customização são poucas ao ponto de serem irrelevantes.

Bem, como maníaco por magos que sou, criei um casal de... magos: um mago clássico e uma Battlemage, pra ser mais exato. E me arrependo amargamente dessa falta de variedade imposta por mim mesmo, visto que as outras classes no jogo (Man-at-Arms, Scoundrel) são extremamente importantes para o avançar do jogo.

Eu, lerdo pra caramba pra lidar com certos elementos de sistema em um jogo desconhecido, só me toquei de que tinha mais dois ajudantes disponíveis desde o começo do jogo quando meu save já calculava mais de 70 horas de extensão. Mas isso é história para outro dia, quando eu decidir lançar um livro chamado “As 100 coisas mais estúpidas que eu fiz jogando videogames”.


WOLGRAFF






















É um baixinho peludo e careca com a maior cara de irlandês e bigode que eu encontrei no mundo de Rivelon. Ele é encontrado em uma caverna abaixo de Cyseal. Observando seus gestos, você descobre que ele perdeu a fala, precisando se comunicar por meio de pergaminhos escritos com uma pena mágica roubada de um feiticeiro.

Wolgraff é um dos melhores personagens do jogo. As brigas silenciosas entre ele e Jahan são hilárias, já que os dois meio que não se bicam muito. O mais legal desse personagem é que, como não fala, seus diálogos são passados para nós por meio de descrições típicas de sessões de RPG de mesa. Eu já joguei muito RPG de livro em uma fase da minha vida, então posso dizer que esse tipo de inclusão me agrada bastante.

Wolgraff é da classe Scoundrel, especialista em furtividade, uso de duas adagas ao mesmo tempo, furto e abertura de fechaduras. Sua habilidade de saltar de um ponto ao outro do mapa só não é mais útil que a capacidade de passar por cima de terrenos hostis sem sofrer dano.
Sua quest pessoal envolve a recuperação da sua capacidade de fala, quando descobrimos que ele foi rejeitado como mago por causa desse pequeno detalhe (os arcanistas nutrem um preconceito enorme com aqueles que não podem verbalizar feitiços). Depois que conseguimos recuperar a sua voz, em Phantom Forest, temos a chance de torná-lo um membro dos Caçadores de Source. O mais legal é que a quest não para por aí: existem vários diálogos subsequentes que envolvem as reações de Wolgraff e seus companheiros à recuperação de sua fala.


BAIRDOTR





















A bela loira de nome quase impronunciável é uma guerreira que encontramos presa em uma jaula, em frente ao quartel de Cyseal. Descobrimos que ela teve uma criação entre animais selvagens, detalhe esse que não rende tantos diálogos interessantes quanto eu achei que renderia, principalmente em se tratando de um jogo com o humor de Divinity.

Confesso que Bairdotr foi um dos ajudantes que menos participaram do meu time. Ela é uma arqueira, da classe Expert Marksman, mas eu a tirei do bando assim que adquiri Wolgraff, por causa da baixa taxa de acerto de seus ataques com arco.

Sua quest envolve encontrar um mago que a educou durante sua adolescência (de nome Jareth, se não me engano). Pelo fato de podermos equipar qualquer arma e aprender qualquer habilidade com qualquer personagem, eu substituí as adagas de Wolgraff por uma besta de duas mãos, e mandei a bela loira tirar umas férias no Salão dos Heróis, no Fim dos Tempos.


JAHAN























Jahan é um dos ajudantes de personalidade mais forte e complicado de lidar. Ele é um ex-rei que perdeu sua fortuna tentando se curar de uma grave doença. Não conseguindo lograr sucesso, foi preciso que ele fizesse um pacto com o demônio Haraka para continuar vivo. Com isso, Jahan foi amaldiçoado com o terrível fardo de ter que viver pra sempre, o que despertou seu ódio e o motivou a virar um caçador de demônios desgostoso com a vida, mas amante dos animais (pela simplicidade e sinceridade dessas criaturas).

A quest de Jahan é bem legal, sendo uma das mais demoradas de completar também. O problema que eu encontrei é que, durante várias ocasiões, ao nos depararmos com demônios, Jahan não deu um pio sobre a situação, o que destoa totalmente da motivação do personagem. Inclusive eu cheguei a colocar ele no grupo, em algumas circunstâncias, para ver se ativava um diálogo especial ou se ele tecia algum comentário mais específico. Nada.

Em batalha Jahan é especializado em Ar, mesmo com a bagunça que o sistema do jogo faz na hora de distribuir habilidades. Sua magia de chuva é um dos recursos mais úteis do jogo, ajudando bastante a evitar status como Burning, ou a atravessar áreas com muitas armadilhas. Antes que eu me esqueça, ele pode ser encontrado na biblioteca de Cyseal. 


MADORA






















Mesmo estando disponível desde o começo do jogo, no bar Crab King, em Cyseal, eu demorei quase oitenta horas pra me tocar de que poderia colocá-la no meu grupo (por causa da minha vagareza já comentada), devido à mecânica de troca de ajudantes do jogo: você só pode colocar alguém de fora se estiver com três personagens em seu comando. Se a party estiver cheia, o ajudante em questão dirá que vai esperar uma vaga aparecer. Se você não se tocar durante o diálogo, terá que esperar oitenta horas pra trocar de personagem...

Bem, Madora é uma guerreira (Man-At-Arms) e Source Hunter, assim como os dois protagonistas. Ela estava na cidade de Hunter’s Edge, quando os moradores da cidade foram massacrados por um exército de Orcs invasores. Ela precisou fugir, e por isso é chamada de traidora e covarde por todos os sobreviventes da cidade que encontra.

Sua quest envolve duas possibilidades: vingança ou redenção contra os saqueadores de Hunter’s Edge. Eu te aconselho optar por redenção, visto que ela concede um troféu à sua coleção (lembre-se que “a vingança nunca é plena, mata a alma e envenena...”).
Em batalha, Madora conta com um leque de habilidades que quase nos faz sentir pena de seus adversários (a razão do “quase” é que a maioria dos inimigos também possuem essas mesmas habilidades).

Isso é hora de tirar selfie, Jahan?

Com essa personagem eu me especializei no uso de espadas longas de duas mãos, dado o dano cavalar que esse tipo de arma causa. Madora, de longe, é uma das melhores personagens pra se ter no grupo, chegando até a diminuir um pouco a dificuldade de alguns combates absurdos que existem no jogo.

Pra finalizer, vale lembrar que podemos contratar mercenários para nos acompanhar, no Hall of Heroes em End of Time. Nem cheguei a andar acompanhado de nenhum deles, mas fica registrado.

Com relação aos nossos dois protagonistas, são exclusivos deles os Traits, traços de personalidade que você evolui de acordo com as escolhas de diálogos. Por exemplo: se você for razoável e escolher opções pavimentadas em lógica, sua barrinha de Reason vai se enchendo. Se você perdoa e é compreensivo, a barra de Forgiver vai evoluindo, e assim por diante. Ser um canalha boçal ou um mocinho de capa-e-espada só depende do seu humor.

É claro que existem milhares de outros personagens presentes no jogo, e que merecem uma menção honrosa (como Icara, Ahru, Cassandra, Zandalor, ZixZax e a Donzela de Ferro falante). Mas você sabe que não tem como eu falar de cada um deles sem escrever um texto que levaria um dia inteiro pra ser lido, não é mesmo? Sendo assim, passemos ao próximo tema.



QUESTS


Há uma quantidade cavalar de quests nesse jogo. Só em Cyseal, a primeira das três grandes áreas do jogo, você já pega umas trinta a quarenta delas, sem exagero.
Só pra abrir o apetite, a primeira quest que você encontrará será a de uma concha mágica falante que quer receber novamente o “abraço do mar”. Você tem a opção de jogá-la na água ou vendê-la no mercado de Cyseal, pra levantar uma graninha. Esse é só um mil avos do tipo de loucura que te espera no restante do jogo...

Algumas dessas missões são bastante simples, se resumindo a “trazer o item A ao NPC B, mas outras dão uma trabalheira dos diabos pra completar. Em sua grande maioria, são muito criativas e resgatam um senso de recompensa há muito roubado por setas indicativas de objetivos, ou diálogos que impedem qualquer surpresa por parte do jogador. Eu arrisco dizer que as quests de Divinity chegam ao mesmo patamar de qualidade de jogos como Skyrim ou Oblivion, sem o menor medo de estar cometendo um exagero.

Quando uma missão envolver encontrar alguém ou algum objeto, não espere que uma seta indicadora de objetivo vá te dizer o que você precisa fazer. São quests que demandam muita investigação e que irão realmente te obrigar a procurar. E não vá achando que a solução correta é sempre a mais óbvia, ou a mais fácil de se fazer. Como diria Roberta Miranda, “às vezes sim, às vezes não...”

Faltou a placa de "Proibido assediar cogumelos".

Na quest da Bruxa Branca, por exemplo, descobrimos que ela guardou seus pertences dentro de um baú, que pode ser encontrado em qualquer lugar do mapa. Um dos meus personagens reclamou desse fato, ao passo que outro respondeu: “e o que você esperava? Setas no mapa marcando o lugar exato? ” É bem assim o nível de sarcasmo e alfinetadas presentes nos diálogos deste jogo.

Já na missão do assassinato de Jake, em Cyseal, fica claro que vários NPCs possuem sempre algo a mais pra se descobrir. Inclusive, o jogo afirma que surgem diálogos inéditos, caso você se aproxime das pessoas em modo furtivo (em teoria, eles falam coisas que não falariam em sua presença). Nesta quest em especial, há uma eterna aura de mistério e desconfiança até mesmo naquelas pessoas dispostas a te ajudar: uma velhinha pode ser apenas isto: uma velhinha; ou pode ser uma necromante de nível 20 que vai convocar um morto-vivo pra chutar a sua bunda até a lua, caso você escolha a resposta errada. Conclusão: não confie plenamente em ninguém desse jogo. Nem em gatos brancos de cabelo rastafári...

É também durante as missões que temos um aperitivo de como é livre a resolução de quests em Divinity. Ainda em Cyseal, existe um maluco que quer matar a Orc filha do prefeito da cidade. Nós podemos seguir a razão, visto que a acusada do crime de exterminar a família do cara nem era nascida na época do ocorrido; podemos matá-la e ganhar a recompensa; ou podemos tentar falar com o sargento da cidade e pedir a prisão do mago. A minha solução foi convencer a Orc a entregar seu medalhão como prova de sua morte, apesar da relutância dela em entregar o objeto (uma herança de família, se bem me lembro).

Sério: esse jogo tira onda pesado com outros jogos de RPG.

Em uma quest que envolvia estátuas, logo no começo, a estátua do vigia pergunta se você quer saber como será o fim da sua aventura. Se responder que sim, o jogo te manda direto pra tela de créditos do jogo! Não consegui segurar o riso quando, na ocasião de realmente ter terminado o jogo (um mês depois), eu vi as letrinhas subindo, acompanhado de uma agradável sensação de déjà-vu. Acho que foi o melhor uso de uma tela de créditos desde o início da indústria de games, e um dos momentos que me fizeram perceber como eu havia me apaixonada pelo estilo debochado e excêntrico do enredo das quests de Divinity.

Noutra ocasião, uma mulher pede pra entregarmos um testamento. Um dos nossos NPCs sugere que alteremos o documento ou que deixemos do jeito que está. O melhor é saber que realmente é possível, pelas possibilidades do sistema de itens, adulterar o papel, muito embora que a ideia grotesca seja condenável aos olhos de alguns de nossos acompanhantes.

Claro, em se tratando de quests, não tinha como deixar de falar da cabeça falante que foi sequestrada por um “agente” de teatro desesperado por plateia. Para avançar, temos que encenar uma peça contando a história de Cyseal. Para tanto, é preciso encontrar, na biblioteca da cidade, um livro narrando o fato histórico. Depois é preciso pagar um carinha pra atrair a plateia dele direto pro seu concorrente, para que possamos levar a cabeça (do pirata Nick) pra um local seguro. Depois disso, só resta a Reginald (o sequestrador da cabeça falante) chorar o leite derramado no palco vazio...

A quest da cabeça falante consegue ser bizarra e engraçada ao mesmo tempo.

Esse tipo de reação dos NPCs me lembrou a ocasião do Troll cobrador de pedágio e de seu filho, que fica chorando sobre o corpo do pai depois que você se recusa a pagar a quantia extorsiva de 1000 moedas de ouro (Trolls têm o péssimo hábito de não aceitar um "não" como resposta, e partirem pra violência). Vale ressaltar que os Trolls nesse jogo fazem jus à fama que o nome carrega na internet. Tem um deles que chega ao cúmulo de cobrar pedágio pra você atravessar uma ponte quebrada... O detalhe mórbido dessa ocasião (que nem chega a ser uma quest) reside no fato de o sistema de jogo nos permitir dar cabo da vida do pequeno Troll órfão também. E ainda somos recompensados com +1 de Compaixão ao fazê-lo! Por abreviar o sofrimento do pequeno? Assim espero...
Por esses detalhes dá pra ver como seus atos interferem no comportamento dos NPCs.

Na missão dos Imaculados, uma das mais intrincadas do jogo, temos a escolha de sacrificar uma galinha ou poupar a sua vida (a penosa implora pra que você tenha piedade, se você comprou a habilidade de falar com animais. Se não comprou, o apelo vai soar como uma cacofonia de cocoricós desesperados mesmo). Optando pela alternativa mais dramática, o corpo da galinha fica disponível como um item. Ao examiná-lo, é possível ler a seguinte descrição: “o corpo de uma galinha que não precisava ter morrido...” Impagável e hilário. É esse tom pessoal, de quebra sutil da quarta parede, que permeia as excelentes quests de todo o jogo.

Esse lugar foi projetado pelo capeta em pessoa.

A parte de entrar no Source Temple foi uma das que mais me fez queimar neurônios desde que comecei a jogar RPGs. Fica a dica: mesmo com a dificuldade, não estrague a sua experiência com este jogo usando detonados ou guias quando (perceba que eu disse QUANDO, e não SE...) ficar preso em alguma missão. Os desafios de Divinity não subestimam a inteligência do jogador, e são bem difíceis sim (alguns despertaram em mim o real desejo de chorar de desespero...), mas nunca chegam a cansar definitivamente o jogador, ou serem pouco recompensadores e injustos.

Quer um exemplo melhor disso? No Templo dos Mortos, somos informados de que apenas matéria orgânica morta pode adentrar o recinto. Perfeito para necromantes e usuários de Tenebrium, péssimo para Source Hunters como você e eu. E sabe qual a ajuda que o jogo te oferece pra que você descubra como entrar no lugar? NENHUMA.
O jogador que se vire. Nada de vozinha chata te ensinando coisas pelo rádio (nesse caso seria uma projeção vocal mágica, já que estamos na era medieval) ou um comando do joystick que te aponta a direção correta. O sufoco é certo, mas o gostinho de vitória e o sorriso no seu rosto serão garantidos, caso você tenha paciência e use a inteligência pra desvendar o enigma.

Isso foi o que eu tive que gastar com terapia, depois que saí do Source Temple.

Infelizmente, nem tudo são elogios às quests de Divinity. A missão em que temos que passar por uma porta falante, no Source Temple, e nos submetermos a uma exaustiva bateria de provações, deve ter sido o motivo de desistência (ou do uso de guias) de muitos jogadores menos pacientes.

Pra passar por essa porta faz-se necessário coletar várias Star Stones e restaurar a Tapeçaria do Destino, que conta seu passado como guardião de uma poderosa relíquia mágica. O problema é que o jogo não dá sequer uma pista do que fazer (apenas uns textos vagos que podem ser comprados com a Vendedora de Segredos, no Fim dos Tempos, que falam a respeito de lugares pelos quais você já passou há muitas horas de jogo atrás).

Por outro lado, por causa da falta de pistas, acabei descobrindo locais que eu não fazia ideia que existiam, e inclusive consegui achar um jeito de impedir os ataques que estavam sendo realizados contra o plano de existência que abriga o quartel-general de Icara, Zixzax e da Tecelã do Tempo.
Acho que ajudar o jogador um pouquinho não mata, mas cobrar isso dos desenvolvedores de Divinity é o mesmo que mendigar décimos de pontos àquele seu professor carrancudo que está louco pra te deixar de recuperação no fim do ano...

Maldita Astarte! Nem depois de morta me dá sossego.

A main Quest do jogo é excelente, respira por conta própria (sem cair na tentação de se “inspirar” em clássicos como Skyrim) e precisa ser montada como um quebra-cabeças.
Você vai ter muuuuuuuito trabalho e queimar diversas sinapses neuronais para conseguir prosseguir na história, e provavelmente vai concluir o jogo sem ter visto tudo que as possibilidades de enredo têm a oferecer (meu caso). Mas a sua dedicação investigativa e empenho em resolver enigmas serão mais que recompensados.

A quest principal de Divinity inclui nossos dois protagonistas (no meu caso, o casal Grognak e Hermione) de uma forma original, inteligente e sem a típica bajulação do “chosen one” tipicamente encontrada em diversos jogos do gênero. Sim, nossos personagens têm uma importância histórica no jogo, mas isso nem de longe pode ser considerada uma vantagem para essa dupla. Quem jogou sabe a que me refiro.

Mas, novamente, nem tudo são flores nesse quesito. Em vários momentos Divinity abusa da paciência do jogador (como no já citado exemplo do Source Temple e sua maratona de puzzles meio que desconexos). Nesse jogo você vai ficar preso, só pra descobrir a saída de um lugar ou resolução de um enigma e perceber que ficou preso de novo. Na quest final, quando já não podemos voltar por meio dos Waypoints, a sensação de desespero e cansaço ao ficar preso no sonho do Trife quase desaba em cima do já calejado jogador, que não aguenta mais se deparar com portas trancadas e botões escondidos atrás de quadros.


APRESENTAÇÃO E ATMOSFERA



A parte dos visuais foi levada muito a sério aqui. Tudo no jogo é detalhado em um nível que beira o desnecessário, e os gráficos do jogo não vão fazer você sair correndo pra comprar uma nova placa de vídeo, mas as fotos vistas durante o post (capturadas da versão de PS4) não me deixam mentir quando afirmo que um excelente trabalho foi realizado.

O design geral do jogo consegue ser satisfatoriamente grandioso, ao mesmo tempo que não estorva a paciência do jogador com ambientes exageradamente complexos. As “cidades” não são necessariamente realistas, em questão de escala, mas tampouco você sentirá necessidade que elas assim o sejam.
Nos ambientes, o jogo apresenta desafios que realmente cobram uma maior atenção do jogador aos detalhes. Várias vezes você vai ser pegar perguntando: “como raios eu chego ao outro lado daquele abismo”? E como é possível destruir uma bloodstone tamanho família, imune a todos os tipos de ataques e elementos conhecidos?

O game nos oferece uma excelente interação com os cenários: além de poder mexer em praticamente tudo que a vista alcança, há formas alternativas de suplantar os obstáculos encontrados nos cenários. Por exemplo: na cidade de Cyseal, eu me deparei com uma armadilha fatal que cuspia enormes bolas de fogo em um longo corredor. Eu podia tentar desarmá-la com meu ladrão, mas preferi testar minha liberdade de gameplay usando o feitiço de teleporte pra atravessar meus personagens a um lugar seguro. Se fosse o caso, ainda tinha a opção de usar a habilidade de absorver dano por fogo, separar meu time e usar uma pirâmide de teleporte pra os outros cruzarem com segurança.

"Me chama de Rose, Grognak".

Mesmo não sendo um dos jogos mais bonitos do mercado, Divinity cativa por outras qualidades: ele possui um visual que não é realista, mas não comete o erro de ser incomodamente caricato. Ele foge daquele estilo meio Final Fantasy Tactics de ser, onde não podemos controlar nosso personagem e ficamos limitados a uma movimentação do tipo “banco imobiliário” ou Jogo da Vida (andando em um mapa de casinha em casinha). Além disso, a animação dos nossos personagens é bem pesadona e super bem detalhada, sendo até mais competente do que realmente precisa ser nesse estilo de jogo tático.

Falando em movimentação, o jogo usa uma perspectiva isométrica quase perfeita. Quase perfeita, pois mesmo com a rotação de câmera em 360° e zoom in e out, ainda senti falta de poder olhar de frente com meus personagens em alguns cenários. Mas fique ciente de que esses são queixumes bobos de um jogador ranzinza e perfeccionista que não consegue deixar de reclamar: se você é um daqueles que defende um Fallout no estilo clássico, ou curtiu Wasteland 2 mais recentemente, Divinity é a prova de que este estilo de câmera ainda funciona a contento.

Ângulos de câmera fantásticos.

O mapa de Divinity, por sua vez, é um dos mais úteis e gostosos de se usar que eu já experimentei em um RPG. Dá pra aumentar e diminuir, criar anotações em QUALQUER ponto que você desejar (recurso que ajuda demais na resolução de enigmas), ou simplesmente dar fast travel a qualquer momento, por intermédio dos Waypoints (portais). Sem falar que os elementos encontrados nos cenários (como lava, rochas ou construções) são representados no mapa de forma a não gerar confusão sobre o local no qual você se encontra. Vale lembrar que o recurso dos Waypoints pode ser utilizado não apenas quando clicamos nos portais. Sim, eu andei pra caramba pelos cenários gigantes antes de me dar conta disso...


Legendas minúsculas e uma janela que tapa a visualização:
que feio, Larian Studios...

Assim como as legendas, as fotos com os rostos dos personagens, nas janelas de diálogos, são muito pequenas e genéricas, o que atrapalha um pouco na hora de acompanhar extensas conversações. Já que falei de janela de diálogo, elas simplesmente bloqueiam quase todo seu campo de visão quando aparecem, deixando sem sentido alguns dos eventos mais legais do enredo. Isso parece ter sido corrigido na continuação do jogo, até onde eu procurei saber.

Algumas mensagens, como quando você aprende uma nova habilidade ou receita, demoram demais pra sumirem da tela, causando certa irritação. Não chega a ser um problema sério, claro, mas com certeza deveria constar da pauta de “coisas a consertar” do Larian Studios, em seus projetos vindouros.

Pra não dizer que eu não coloquei pra fora tudo que eu tinha encontrado de errado com este jogo, a capa de Divinity é de uma tosqueira que simplesmente não condiz com a qualidade final do game. Fica difícil entender como um jogo com um indiscutível valor artístico em várias áreas, pode ser vendido com uma capa genérica que o deixa com cara de jogo de baciada de fundo de prateleira.
Divinity é um jogo que não só tem personalidade como trabalha de forma fantástica o lore criado por ele mesmo. As piadas com o gênero e as referências a outros jogos só vão até certo ponto, sendo ele um jogo com características de enredo marcantes que sabem se levar a sério nos momentos certos. Mas não é isso que um jogador desavisado vai sentir ao olhar pra capa desse jogo.


Diga se não parece aquelas capas de tower defense genéricos.

No quesito atmosfera, só tenho elogios a tecer: existem masmorras, cidades, campos congelados com baixa visibilidade, campos desérticos, castelos imponentes, florestas amaldiçoadas, e jardins da Criação perfeitamente representados pelas possibilidades gráficas do jogo. Não sobra muito pra falar a esse respeito: a atmosfera presente nos ambientes é construída a fim de passar a exata impressão que aquele momento de enredo exige. Mais um ponto pro Larian Studios.

A parte sonora de Divinity me passou a impressão que não é tão difícil assim realizar um trabalho competente nesse quesito de um projeto, mesmo quando estamos falando de um estúdio pequeno financiado pela boa vontade de Kickstarters.

A dublagem do jogo é excelente. Mesmo com a repetição de alguns diálogos (parece que esqueceram de colocar uma trava que impeça que um mesmo personagem recite uma frase que acabou de ser dita há dois segundos), a quantidade deles é mais que satisfatória. Há uma infinidade de vozes dubladas pra tudo, e alguns diálogos são tão inusitados que capturam totalmente a sua atenção (como quando um personagem se engasga de tanto rir, nos combates, depois de acertar um critical hit no inimigo).
As vozes dos ratos são meio irritantes, mas cumprem seu papel (bem como a dos outros animais, que possuem vozes e maneirismos de fala condizentes com suas características animalescas).


Nível de detalhes que beira a obsessão.

Divinity é o clássico jogo em que você perde muito por não jogar usando fones de ouvido. Nas cidades, por exemplo, é possível ouvir as conversas dos moradores em diferentes níveis de intensidade, e elas vão diminuindo de volume enquanto você se afasta. É o tipo de esmero com detalhes que te faz perceber a intenção quase palpável dos criadores em entregar um produto refinado em todos os aspectos.

Como não podia faltar em um bom jogo, a trilha sonora do game é soberba. Esqueça aqueles temas clichês, típicos de RPGs medievais que você conhece. Divinity possui uma OST excelente e original, que passeia por vários estilos, de tecno a canto gregoriano e rock, ou mesmo um pouco de dance. Não espere entrar em uma taverna ou castelo e ouvir uma típica música de taverna ou castelo: mesmo quando o faz, o jogo deixa claro que está tirando um sarro com esses lugares comuns do gênero.



SISTEMA


Divinity é uma miscelânea de praticamente tudo que você já viu em outros jogos, uma colcha de retalhos de outros RPGs consagrados. Mas o que eu não vou esquecer de falar é que essa colcha é feita de retalhos da mais alta qualidade, com uma costura feita por tecelãs da melhor categoria. Lembra daquilo que eu sempre digo, de que não é preciso ser original para se destacar? Então, esse jogo é um ótimo exemplo disso.

Pra ele ser um amálgama perfeito do gênero, só faltou um jogo de cartas e um mini game de abrir trancas. Quer dizer, acho que esse último não fez a menor falta. Pense em um sistema de RPG e provavelmente ele vai fazer parte de Divinity: criação inútil de itens; identificar itens desconhecidos; destrancar portas e baús; roubar; combinar dois itens para formar um terceiro; desativar armadilhas; está tudo lá, mesmo numa roupagem diferente.

Um dos recursos mais úteis do jogo.

Felizmente, todos esses elementos (ou quase todos) funcionam de uma forma que vai do satisfatório ao espetacular: nada no sistema é feito de forma desleixada ou nas coxas.
Os elementos que estão lá funcionam muito bem, sempre a serviço do jogador e pensando em facilitar a sua vida. Por exemplo, ao pressionar segurar X é ativado um perímetro de pesquisa de itens. Nele, todos os itens interativos ficarão listados pra que você possa vasculhar. Mesmo que esteja longe, o personagem vai andar automaticamente ao lugar e examinar. Nem precisa dizer que, em um jogo de investigação e detalhado como esses, esse recurso me salvou de ficar preso mais vezes do que eu consigo imaginar.

Ainda no campo do inventário, há uma forma bem prática de enviar itens aos nossos acompanhantes, bem como de organizar os equipamentos, pergaminhos, poções e toda sorte de quinquilharia que você vier a coletar em sua aventura. E por falar nisso, é incrível a quantidade de itens inusitados e absurdos que podemos carregar e encontrar no mundo de Rivelon.

O comando Last Added adianta demais a vida.

E o recurso que mais me agradou no inventário dos personagens (sim, cada personagem tem um inventário, podendo carregar por padrão 100 kg de peso) foi um comando de organizar. Lembra quando você pegava um item em um RPG como Skyrim, e não conseguia mais encontrá-lo em sua lista de objetos? Aqui isso nunca vai acontecer, por causa do comando de organizar por ordem de aquisição: os itens que você pegou por último vão aparecer no topo, facilitando a identificação e o escambo entre ajudantes.

Vale também ressaltar que o jogo não conta com uma estrutura tradicional de lojas. Sim, existem lojas especializadas em armas, ou vendedores de poções, livros de técnicas ou pergaminhos mágicos. Mas a novidade aqui é que não só as lojas vendem itens: praticamente QUALQUER personagem pode participar de relações comerciais durante as suas andanças. E eu usei a expressão “relações comerciais” pelo fato de ser possível não apenas comprar ou vender itens, mas também trocar ou doar objetos entre os NPCs do jogo. Confesso que esse não foi um recurso que utilizei muito (assim como a criação de itens), mas as possibilidades estão disponíveis aos jogadores mais abertos a esse tipo de mecânica.

Ganhando o debate na base do xaveco.

Nas interações com a janela de diálogo, há um mini game bem legal de pedra, papel e tesoura (o famoso Jo-Ken-Po) que funciona da seguinte forma: em situações de conflito, um NPC vai se recusar a falar com você ou deixar você passar. Na janela de diálogo, serão oferecidas algumas opções para você convencer o personagem a cooperar. As opções são: intimidar, conquistar e racionalizar. Depois de escolher uma das opções, vai começar uma batalha de Jo-Ken-Po, com uma barrinha de dez níveis. Cada vez que você ganha um round, um total de bolinhas da barra vai se encher, dependendo do seu nível na habilidade escolhida. Isso quer dizer, por exemplo, que se você tiver 5 no atributo Razão (como era meu caso), só precisará ganhar duas rodadas pra convencer o NPC a te ajudar. Mas o mesmo vale pro adversário, então é bom tomar muito cuidado. Reza a lenda que o recurso de doar objetos serve pra “amaciar” o NPC durante estes embates, mas isso foi algo que eu simplesmente não tive a curiosidade de testar.

Habilidades: é preciso um pré-requisito para obter algumas.

Um detalhe bem legal desse jogo, além da originalidade, é que existe uma lógica a ser seguida que vai variar muito de acordo com seu adversário. Quem já jogou Alex Kid sabe como Jo-Ken-Po é um jogo que parece inocente e fácil, mas que se trata de um estratagema de Lúcifer em pessoa para semear a discórdia entre os homens da Terra.
A CPU sempre parece adivinhar o que você vai escolher, e colocar o exato oposto pra te sacanear.

Mas em Divinity isso varia um pouco. Por exemplo: se você batalhar Razão contra um mago (que precisa do atributo Intelligence alto para executar feitiços), prepare-se para enfrentar um oponente que varia bastante suas táticas de jogo (você coloca papel, ele coloca tesoura. Você coloca pedra achando que ele vai colocar tesoura, mas ele coloca papel. Aí você coloca tesoura pra se adiantar, mas ele coloca pedra...). Mas, ao enfrentar um Orc (uma raça não muito conhecida pela sua esperteza), ele vai ser burro e previsível, sempre escolhendo a opção mais óbvia e esperada por você.


COMBATE






















Divinity é um RPG tático por turnos, como XCOM ou Final Fantasy Tactics. Por essa comparação você já pode ter uma ideia do que vai encontrar pela frente. Mas gostaria de adiantar que o combate é um dos pontos mais altos neste jogo. Ele é dinâmico, empolgante (até mesmo pela música, que é super animada) e estratégico em um nível que eu e minha parca experiência com o gênero ainda não tínhamos visto.

O destaque pros entraves do jogo vai para os elementos de campo e os status relacionados a eles. O sistema de Divinity trabalha com a existência de quatro elementos naturais para magias e status: fogo, água, vento e terra. Fogo é autoexplicativo. Água engloba magias de gelo, de água líquida mesmo (a mágica de chuva é surpreendentemente útil) e cura. Ar envolve magias de invisibilidade, eletricidade e teleporte. Já a terra abrange ataques de terra mesmo e veneno. Também há algumas magias negras e de invocação, da classe Bruxo/a, mas não são elementais.

A graça aqui está na forma como eles participam dos combates: gelo cria superfícies escorregadias que fazem seu personagem (e os inimigos) caírem e darem com a cara no chão, perdendo a vez de agir. Fogo causa dano constante e incendeia superfícies oleosas ou nuvens de veneno. Eletricidade paralisa, podendo ser combinado com água no chão ou nuvens de vapor para causar uma cortina elétrica no ar. E veneno causa dano gradual.


Sim, chuva de fogo é uma das possibilidades abertas pelo sistema de Divinity.

Então o esquema é o seguinte: você pode lançar um feitiço de gelo para imobilizar o oponente. Depois que o gelo derreter, você pode usar um outro personagem para lançar um raio e criar um tapete eletrificado, o que vai fazer com que os inimigos desperdicem pontos de ação dando a volta no terreno, pra não levar dano. Uma gangue de duendes kamikazes cruzou o seu caminho? Não tem problema: use sua magia de fazer chover pra apagar o pavio das bombas que eles carregam nas costas que fica tudo bem.

Quando estiver em confronto, tenha em mente que uma reles poça d’água no chão ou o simples fato de estar chovendo podem alterar drasticamente o rumo da batalha. Mas tenha em mente também que a sua experimentação em campo de batalha vai ser recompensada de forma quase sempre positiva: tente congelar um inimigo e depois arremessá-lo como com Telecinese para mais detalhes...

O sistema de combate de Divinity é muito rico, variado e criativo: mas não vá pensando que as batalhas desse jogo vão ser como estar em um parque de diversões: a mesma gama de possibilidades que vale pra você também vale pros inimigos, e pode ter certeza que a malícia deles vai ser capaz de te ensinar um truque ou outro que você nunca teria pensado por conta própria.


Nenhum elemento dos cenários está lá à toa. Acredite.

Antes que eu me esqueça, é preciso dar um aviso muito pertinente, que vale não apenas com relação aos combates, mas para todo o jogo em si: quando Divinity te avisar de alguma ameaça (como estradas assombradas por fantasmas ou campos infestados de zumbis), LEVE O AVISO MUITO A SÉRIO. Isso porque esse jogo não é nada fácil...

Os confrontos encontrados nos cenários podem vir de qualquer direção (desde uma malfadada escavação de tumba até um NPC irritado com alguma coisa que você fez no ambiente), mas siga a seguinte regra de ouro: se um inimigo estiver mais que dois níveis acima de você, CORRA! Eu joguei no nível equivalente ao normal, mas, dependendo do tipo de inimigo (aranhas, orcs, demônios), mesmo estando no mesmo nível você vai levar uma surra de dar pena, se inventar de pegar certas batalhas antes da hora.

As lutas em Divinity podem (e vão) ser muito desafiadoras. Ignore completamente a regra dos dois níveis que eu acabei de criar logo acima: dependendo da sua criatividade e capacidade de improviso, é possível suplantar desafios que beiram o impossível (como no caso dos cânions de Luculla Forest, ou Hiberheim e seu eterno status chill...).


Cuidado por onde anda: uma inocente caverna pode se tornar o endereço da sua lápide.

Um bom exemplo da dificuldade dos combates é o chefe do farol, ou de lugares com superfície de lava (existem uma tonelada de armadilhas que causam esse tipo de terreno, a ponto de encher seu saquinho em um nível Jar Jar Binks de pentelhação).

Pra piorar, Divinity conta com aquele problema clássico de jogos casca-grossa: se seus dois personagens principais morrerem, é game over. Céus, como eu detesto isso num jogo. É muito frustrante e ilógico ter dois aliados gozando da mais plena saúde em campo de batalha e levar uma mensagem na cara de “seu grupo foi derrotado”, sendo que o simples uso de um pergaminho de ressurreição resolveria o problema.

Há uma tonelada de magias de cura, mas apenas uma de ressurreição, e ela só pode ser adquirida por alguém com nível máximo de Witchcraft, e praticamente no final do jogo. Então, aceite o fato de que passará toda a sua aventura dependendo de pergaminhos de ressurreição. Isso sem citar o fato de que, nesse jogo, não há nada parecido com regeneração de HP (não ao menos sem usar feitiços de cura) ou ressurreição automática ao fim de batalhas: se morrer, seu personagem passa a ser representado por um túmulo, e só voltará à vida com o uso de um pergaminho.


Essa magia é linda. Mas não fui eu que soltei. Eu juro!

Apenas pra encerrar esse subtópico, as batalhas são bem legais: as magias e técnicas são bastante impactantes e prazerosas de se executar. Mas, para fazer jus à porção Shadow do meu nome, vou encerrar essa parte com uma falha que os combates do game possuem: o cursor para ataque e movimentação é bem confuso e problemático, ao menos nas primeiras horas de jogo. E se você vier com o papo furado de que isso é falta de teclado e mouse, eu vou te mandar catar coquinho e conversar besteira no ouvido de outro, visto que temos ótimos exemplos de jogos desse gênero que funcionam muito bem em consoles (como o já citado XCOM).

Qual o problema com o cursor? Ele é muito pequeno (às vezes ele meio que se separa do alvo, virando uma bolinha azul quase imperceptível), lento e pouco intuitivo para algumas ações que deviam ser simples, como selecionar alvos pra atacar ou andar.
Mas Shadow, seu jegue: pra atacar existem os comandos de L1 e R1, que saltam de alvo em alvo automaticamente. Isso seria uma solução, se não fosse pela maldita mania do jogo de sempre selecionar o alvo que ESTÁ MAIS DISTANTE DO SEU PERSONAGEM...


Esse cursor é motivo de muita dor de cabeça, até você pegar o jeito.

Eu menti quando disse que ia encerrar o subtópico com uma reclamação. Na verdade, serão duas. Apesar de muito bom, o sistema de Divinity conta com aquele tipo de liberdade que acaba descaracterizando as classes disponíveis pra escolher na criação de personagens. Por exemplo: é bastante broxante jogar com um Scoundrel (o típico ladrão) e poder usar, mesmo com a cobrança de certos requerimentos, uma varinha mágica ou um arco-e-flecha de arqueiro.

É muito estranho ver um ladrão usando magias de gelo através de um pergaminho que só deveria ser compreendido por aqueles com inteligência alta, ou seja, um mago. Eu sei que elogiei essa falta de amarras ao sistema no review do Kingdoms of Amalur, caso você tenha lido. Mas a diferença daquele jogo é que tínhamos uma desculpa sólida apoiada pelo enredo (o fato do personagem não ter um destino certo) para podermos evoluir de qualquer forma, ou reiniciarmos a distribuição de pontos de experiência.

Claro que você pode fazer como eu, e se manter numa mesma árvore de habilidades com determinados personagens (Grognak ficou sendo meu mago especializado em fogo e terra, e Hermione em água), e há punições para usar habilidades pertencentes a outra classe. Mas, ainda assim, essa falta de personalidade me incomoda um pouco.


Vale matar Trolls inocentes pra ganhar um pouquinho mais de XP? Com certeza!

Pra encerrar o subtópico Combate e parar de mentir pro leitor de uma vez, preciso citar um ponto, que não chega a ser um defeito, e sim uma questão de escolha: as batalhas de Divinity são finitas. Isso quer dizer que você não poderá ficar entrando e saindo de ambientes para renovar os inimigos. Eles não voltam, e seus corpos ficam no chão, como um testemunho mórbido do momento que você viveu quando passou por um determinado lugar. E se você é um jogador veterano de RPGs, pode começar a enxugar o suor frio que escorreu da sua testa neste exato momento. Não se preocupe, mesmo que sua mente não tenha conseguido assimilar o terror descrito no parágrafo acima, eu traduzo pra você: NADA DE FARMING, UPPAR OU QUALQUER COISA PARECIDA.

Isso mesmo: muito embora que você possa, no final do jogo, reconfigurar seus pontos gastos, a quantidade de XP que você ganha é limitada. O que eu gosto neste sistema, já conhecido de jogos como o primeiro Diablo, é o tom de definitividade que permeia os jogos que optam por esse caminho. por outro lado, eu confesso que prefiro o sistema de jogos usado pela Bethesda, no qual os inimigos de áreas fechadas não retornam, mas os de áreas abertas sim.


OUTROS DETALHES DO SISTEMA























Há alguns detalhes do sistema deste jogo que permeiam várias áreas que não necessariamente os combates. Por exemplo, a interação com objetos nos cenários nas mais diversas situações. Além de ficarem no caminho de ataques e representarem obstáculos, os objetos também servem para os mais diversos fins: coloque um barril em cima de uma armadilha para desativá-la; use uma caixa para manter um botão pressionado e poder passar; acenda ou apague velas e candelabros para criar incêndios ou resolver algum puzzle; e assim por diante.

Ainda dentro de pequenos detalhes do sistema, as escolhas que você faz em certas quests realmente alteram uma coisa ou outra na jogabilidade: em Hiberheim nós encontramos um poço dos desejos chamado Walter que se perdeu do irmão (lembra que eu falei que a zoeira nesse jogo é pesada?). Se você pagar uma determinada quantia em dinheiro para ele (ou persuadi-lo no desafio de Jo-Ken-Po), o canalha te concederá um desejo: acabar com a nevasca que assola a região feérica, ou apagar o fogo que castiga as terras ao norte.


"Nossa! Quantos detalhes de sistema!"

Divinity é um jogo que nunca engana o jogador, ou faz promessas que não quer cumprir: se você encontra um poço dos desejos falante que diz que vai acabar com uma nevasca, tenha a certeza que uma nevasca está com seus dias contados (e você livre de visibilidade zero e do status chill).

Pra encerrar a aba SISTEMA de uma vez por todas, queria fazê-lo falando a respeito do único bug que presenciei no jogo: às vezes, você ou um inimigo vai ficar meio que empacado depois de finalizar uma ação. Esse é um problema que ocorre com uma frequência suficiente para você lembrar que ele existe, mas nunca a ponto de tirar a sua vontade de prosseguir no jogo. E é um bug que passa por conta própria, sem precisar reiniciar o console ou colocá-lo de cabeça pra baixo, então...



CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE DIVINITY: ORIGINAL SIN



Você tem a confirmação absoluta da incompetência da imprensa de games quando acontece de um jogo tão fabuloso quanto Divinity passar completamente despercebido pelos veículos de mídia da forma como passou. Ele é o caso daquele jogo que é lançado totalmente sem nenhum alarde, deixando pra marcar presença apenas no final do ano, em alguma posição obscura de “Surpresa do Ano” em listas típicas desse período.

Projetos como esse são a prova mais pragmática de que é mais que possível haver um meio termo lucrativo entre um jogo criativo, de orçamento modesto executado com amor, e um arrasa-quarteirões de 100 funcionários movidos a 200 milhões de dólares de orçamento.

Divinity renova a esperança daquele jogador cansado dos golpes e artimanhas utilizados por uma indústria mal-agradecida que, às vezes, só consegue enxergar seu consumidor como uma possibilidade viva de extrair mais lucro. Ele fura a fila dos RPGs medíocres, passando na frente de seus irmãos de gênero, entregando um produto com total esmero e vontade visível de fazer bem feito pela simples vontade de ver algo de qualidade sendo enviado às prateleiras.


"E aí, Guardiã, tá a fim de fazer uma sacanagem com a humanidade?"

NOTA FINAL: 9,0

Claro que ele não é perfeito. Alguns probleminhas precisam ser corrigidos para que o jogo possa disputar o páreo de melhor série de RPGs da década. Mas, mesmo com falhas, Divinity é o jogo que eu gostaria que fosse usado como molde para os RPGs feitos daqui pra frente.

Sim, há alguns tropeços na experiência que é Divinity. As batalhas finais, por exemplo, são tão apelativas que quase me fizeram desistir de jogar, pois ficou claro o dedinho dos desenvolvedores em garantir que o jogador não teria sossego nem mesmo nos minutos finais de gameplay.

Mesmo no nível 19, sendo que o máximo é 20, o jogo não desiste de espezinhar o jogador com uma sucessão de batalhas exaustivas, intercaladas com enigmas desnecessariamente burocráticos pra um final de uma campanha que durou mais de 116 horas. Se não tivesse acabado no momento certo, acho que eu começaria a desenvolver um sentimento de raiva e frustração contra esse jogo, tamanho o sofrimento e provações que eu passei ao longo da aventura.


Não é a batalha mais difícil do jogo, mas prepare-se pra passar sufoco.

Também não consigo deixar de pensar que Divinity implora por elementos de jogabilidade tais como um mini game de cartas, ao estilo Gwent (se ele não se acanha em copiar elementos consagrados, por que parar por aí e deixar de plagiar um que é bom e funciona?). Mas o caso é que o jogo manda bem em tantos departamentos, que só nos resta especular sobre como ele poderia ser melhor do que já é, e suspirar pela já existente continuação do game (ainda não tem confirmação pra consoles, infelizmente).

E é isso, clientes cativos do Mais Um Blog de Games. Espero que tenha conseguido tecer um texto agradável de se acompanhar, ao mesmo tempo que indiquei um jogo que a maioria dos jogadores não faziam ideia de que era tão bom. Obrigado pela atenção, e nos vemos no próximo post.


Au Revoir!

5 comentários:

  1. Cara, continue com seu blog, amei o jogo, a postagem e você, embora não o conheça

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  2. Oi, Shadow. Cara, sensacionais os seus reviews! Sério, absurdos, matéria de altíssima qualidade, parabéns.

    Gostaria de entrar em contato com você por e-mail...é possível?

    Um abraço!

    Mateus

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    Respostas
    1. Mateus, obrigado pelos elogios. Você pode entrar em contato com meu assessor pelo seguinte email: welbenn@bol.com.br. Mas adianto que parcerias eu não estou fazendo no momento, por falta de tempo.

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  3. Obrigado, Gustavo. Nem se preocupe que eu não tenho a mínima intenção de abandonar o blog. Faz parte da minha vida.

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  4. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

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