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domingo, 3 de dezembro de 2017

ANÁLISE: ALIEN RESURRECTION (PS1)






















O ser humano é um dos organismos mais nocivos e prejudiciais ao equilíbrio das coisas naturais que já habitou o nosso planeta. Isso é fato, e não é preciso finalizar uma faculdade de biologia pra chegar a essa óbvia conclusão. Misantropias à parte, são raras as vezes em que o homem acaba provando do próprio remédio, ou sendo vítima das mesmas fraquezas e traços de personalidade (como a curiosidade) que se configuram, ironicamente, como suas maiores qualidades.

A franquia Alien, no meu modo de enxergar as coisas, é um exemplo de ficção que está sempre pronta a colocar o pequeno Homo sapiens em seu devido lugar, sempre trazendo o lembrete de que existe um peixe maior à espreita: não tem como topar com um Alien, ou xenomorfo pros íntimos, sem se dar mal no processo. O que você faz quando lida com criaturas com esse nível de agressividade e instinto de sobrevivência? Você morre. Simples assim. Palavras da própria Ellen Ripley.

Mas, e quanto a um dos jogos mais difíceis e desafiadores já lançados para o PS1, o que você faz quando aceita o desafio de completar um jogo desses? É isso que eu pretendo explicar com o post de análise de Alien Resurrection para PS1. Senta que lá vem história...


HISTÓRIA (5,0)



Eu não falei que lá vinha história? Então, piadas sem graça à parte, é simples resumir o enredo de Alien Resurrection, o jogo: ele é simplesmente o mesmo de Alien Resurrection, o filme, sem tirar nem pôr, salvo algumas mudanças pra que os acontecimentos vivenciados no game se adaptem às necessidades da mídia em questão.

De resto, quem assistiu já sabe: cientistas do Mal fazem merda; soldados boludos querendo te currar sem dó nem piedade aparecem pra apimentar as coisas (muito embora que esse plot combine mais com o Alien 3...) e Shazam: temos um enredo tão cópia em carbono do filme que fica até difícil atribuir uma nota a ele (por isso escolhi a média e decidi permanecer em cima do muro).

Fora isso, é preciso salientar que há sim novos diálogos escritos especialmente para o jogo (cientistas e outros NPCs ao longo dos cenários), mas não há dublagem nas transições de fases, quando você se comunica com um dos personagens jogáveis (Ripley, Distephano, Christie e Call). Isso seria um grande problema nesse aspecto, se não fosse pelo detalhe da qualidade das vozes que eu vou detalhar no tópico a seguir.

Esse aí não tem mais nenhuma história pra contar...

Sim, o jogo não tem a menor pretensão de consertar as cagadas narrativas arremessadas pela sua contraparte em película: Ripley continua sendo um clone, os aliens estão tocando o terror em uma espaçonave fortemente militarizada e preparada para recebê-los e todos querem: ou um módulo de fuga ou alcançar a Betty antes que a vaca vá pro brejo ou acabar com a sua raça na base do chumbo quente.  Como eu disse, é o mesmo plot do filme... Pra ser mais exato, o jogo começa naquela parte em que Ripley está aprisionada em uma cela, e ele vai estendendo os eventos do enredo (como a destruição dos clones) para se encaixar no seu progresso de jogo.

Como acontece com todo jogo de Alien, alguns detalhes estão meio que fora do lugar. Os facehuggers, por exemplo, grudam na cara de Ripley (se você assistiu ao filme e conhece a desculpa esfarrapada que deram pro retorno dela saberá por que isso não faz o menor sentido). Call, por sua vez, usa quites de primeiros socorros pra restaurar sua “vitalidade”. Fora esses detalhes bobos que só nerds tiozões percebem, Alien Resurrection, de longe, seria um dos jogos mais fiéis à mitologia da série até que o Isolation fosse feito.

Mesmo com uns probleminhas de lógica, a Argonaut parece ter feito a lição de casa a contento: há momentos clássicos da franquia, como os de rastejar por dutos de ventilação, que compensam as poucas falhas criativas que este jogo possui. Sem dúvidas, há mais acertos que erros na composição de enredo e eventos em Resurrection, o que fez dele o primeiro jogo de Alien “pra valer” que eu joguei.

Esse é o jeito de Distephano perguntar o caminho da saída...

Como eu falei, algumas licenças poéticas precisaram ser tomadas pra que um filme de 1h 56 min rendesse um jogo de 10 horas de duração. A USM Auriga do jogo, por exemplo, é no mínimo umas dez vezes maior que a espaçonave militar na qual o filme se passa. Também há o “pequeno” detalhe de que há cerca de 20 vezes mais aliens (e estou sendo bem generoso nesta contagem, visto que o game não exibe o total de inimigos mortos ao final da campanha) que os 12 da película. Mas somos obrigados a dar um desconto nesse quesito, devido às já citadas necessidades de transposição de uma mídia de entretenimento pra outra.

Pra não dizer que não falei de tudo que me veio à mente no tocante a enredo, há um easter egg no game que eu fiquei até agora sem entender: na parte de destruir os clones, com Ripley, precisamos usar um cartão de acesso pra desativar um campo de força que impede nossa passagem. É então que Father, a IA da USM Auriga, diz: “obrigado, cabo Hicks. Bem-vindo ao setor de Desenvolvimento & Pesquisas”. Seria um parente futuro do clássico marine do segundo filme ou eu viajei legal na maionese? Enfim...

Essa foto ganharia um concurso de legendas engraçadas fácil fácil.

Os mais atentos vão encontrar outras referências, como algumas composições de cenários que remetem a cenas do filme. Um exemplo que consegui identificar foi aquela sala da cena do jogo de basquete, na qual Ripley tira o maior sarro com a cara do personagem de Ron Perlman (que infelizmente não é jogável e sequer está no jogo).

Pena que nessa localidade aconteça uma das maiores incongruências, em questão de gameplay, que o game tem guardado pra você: é lá que você enfrentará soldados (sem nenhum tipo de armadura) que aguentam mais tiros de fuzil que uma Alien Rainha. E tudo isso pra justificar a aquisição de cartões de acesso a uma porta eletrônica. Bad call, Argonaut Games. It was a bad call...

Só pra finalizar esse tópico (do qual eu não tenho muito mais o que falar), a própria cena em CGI, antes de acessar o menu principal, deixa bem claro o público-alvo desse game ao resumir os acontecimentos do começo do filme. Se você não assistiu ao filme ou não está habituado ao universo de Alien, passe bem longe de Alien Resurrection, a menos que um dos seus passatempos favoritos seja terminar jogos insanamente difíceis nas horas vagas.


GRÁFICOS (9,8) E SOM (9,5)



Alien Resurrection, no tocante a visuais, é e sempre foi um jogo de vanguarda, um jogo à frente do PS1 e seus escassos 2mb de memória RAM. Logo nos primeiros segundos no controle de Ripley você se encontra em um ambiente de atmosfera sombria e aterrorizante, que incentiva a exploração cautelosa e a troca de cuecas a cada nova partida. De fato, esse foi o primeiro jogo de videogame que me fez sentir medo real ao jogar, e não apenas receio de perder o progresso. Ele aproveita o material-fonte da franquia e o eleva a um nível jamais visto nos games dessa série até então, ao menos não por mim. É isso que todo spin-off devia ter em mente no tocante a atmosfera, visuais e construção de cenário.

O gore, por sua vez, é de alto nível e casa perfeitamente com o clima de “estou fodido” que impera nos filmes da série. A violência gráfica desse jogo é algo que se podia esperar  do contexto mundo cão sempre presente nos filmes de Alien: atire num cadáver e ele vai pintando o chão e paredes de vermelho; aliens se debatem em uma poça de ácido ao serem abatidos e, dependendo da arma utilizada, cabeças podem sair voando ou corpos explodirem numa nuvem amarelo-ácida bem legal de se assistir. Não ficou nem um pouco impressionado, pois esse tipo de coisa já faz parte do defaut dos jogos atuais, não é mesmo? Normal, mas lembre-se que estamos falando de um jogo de PS1 lançado no longínquo ano de 2000.

No escuro e com fones. Não esqueça dos fones...

Este jogo fica melhor quando jogado no escuro”, diz a tela de load. Essa dica por parte dos criadores dá uma ideia das camadas de atmosfera assustadora e rica sob as quais Resurrection é pavimentado, muito embora que esse clima meio que seja estragado por causa da indiscutível repetição de inimigos nos ambientes.

Esqueça qualquer coisa que lembra a palavra linearidade quando pensar em cenários: há portas emperradas; terminais de computador com acesso por biometria; longos corredores que chegam a dar receio de explorar; e por aí vai. Cada descida de escada, cada virada de costas pode culminar com seu personagem morto no chão ou pior: acordando com uma criaturinha parecida com uma aranha “dormindo” bem ao seu lado...

O nível de detalhes é enorme, indo além do que achávamos que o nobre PS1 seria capaz de nos entregar. Em alguns cenários, por exemplo, há goteiras de ácido retumbando no chão e fazendo buracos nos pisos da nave. Claro que esses detalhes não ocorrem em tempo real, sendo eventos estáticos atrelados à cenografia do game, mas raios, o que você esperava? Estamos falando de um console equivalente a um Pentium 133!

Se não conseguir mirar na cabeça, acerta o baço que tá tudo bem.

Diferente do Meu Review Supremo de Alien Isolation, que pode ser lido AQUI, não cabe um tópico especial dedicado aos aliens de Resurrection, visto que aqui eles atacam em ondas e não são exatamente a estrela principal do show. Mas cabem sim alguns elogios à forma como eles foram inseridos no jogo. De forma geral eles são bem dinâmicos, saltando do teto e de várias direções em cima de você.

Eles, muito embora que depois das acrobacias venham em linha reta te atacar, andam dentro de tubulações e se escondem nos cantinhos mais escuros e apertados da USM Auriga pra tentar te pegar desprevenido. É com muito pesar que venho avisar que, na maioria das vezes, isso dá certo até demais da conta...

Você tem a certeza de que um jogo foi bem-sucedido nos aspectos técnicos de gráficos, design de ambientes e atmosfera no momento em que você se flagra com medo de avançar pelos cenários, ou comemorando quando finalmente encontra um painel de save pra aliviar um pouco a tensão causada pela dificuldade do game.

Ele Morreu. Eu acho...

A parte sonora, por sua vez, justifica a nota alta dada por mim no título do tópico, acredite e confie. A dublagem realizada pela Argonaut é soberba e minimalista (preste atenção ao som das cápsulas de sua arma quicando no chão e volte aqui pra concordar comigo depois). Isso fica claro logo no primeiro minuto de jogo, quando Father acorda Ripley debaixo de avisos de que a merda foi arremessada nos dutos de ventilação da Auriga. Se duvida, coloque seu fone 7.1 e clique no botão de play abaixo:



Falando em fone 7.1, é uma pena (pra não dizer desastre) que não haja um modo de plugar fones de ouvido no PS1, pois a parte sonora desse jogo é o tipo de coisa que justifica aquela minha velha frase de que o som é 50% da experiência com um jogo, pra mim. Só a narração de Father já é um deleite àqueles loucos por voz sintetizada, como este que vos escreve. Se eu for falar do som de passos, tiros, hiss dos aliens e barulhos os mais diversos, aí eu teria que transformar esse post em um Review Supremo dos Sons de Alien Resurrection.

De fato, eu sou tão louco pela dublagem desse jogo que, às vezes, eu aperto botões que eu já sei que não vão abrir porta alguma só pra ouvir Father falando novamente. Por favor, não chamem o sanatório pra me internar por causa disso. Eu juro que nunca machuquei ninguém pra satisfazer meus fetiches por vozes sensuais (sejam masculinas ou femininas) digitalizadas. Eu sei que eu sou meio pirado com aspectos sonoros de um jogo mas, se eu fosse uma pessoa normal, qual seria a graça em ler meus posts, não é mesmo?

Os efeitos sonoros de TODAS as armas dão show.

Diferente do Alien Trilogy, também pra PS1 e que segue o maior "estilo Doom" de ser, Resurrection não possui música ambiente de qualquer espécie. Em um jogo governado por uma atmosfera sufocante de terror e ansiedade a cada passo, isso passa longe de ser um problema. Muito pelo contrário: a ausência de música, aliada à altíssima dificuldade, vem apenas pra contribuir com a insistente sensação de “coração na mão” que vai permear cada partida nos corredores escuros da Auriga.

Ainda babando com a dublagem de Father, a parte onde ele começa a passar por “dificuldades técnicas” é mais um deleite aos fãs dos equalizadores sonoros do Windows como eu. É um prazer quase orgásmico ouvir sua bela voz sintetizada se desmanchando em distorções dignas de uma turnê de Daft Punk, ao passo que você começa a imaginar como devem ser reluzentes e molhadinhos os componentes internos de sua placa-mãe e ... aham, é ... desculpem. Me empolguei. Vamos continuar com o texto.

Infelizmente, apesar de todos os elogios molhados a Father, há um único problema que me impede de dar nota 10 pro quesito sonoro desse jogo. Como eu já adiantei, a ausência de dublagem em alguns diálogos (especialmente nos terminais de comunicação entre as fases) faz falta para uma melhor identificação dos personagens jogáveis e imersão com a história. Mas seria essa uma limitação técnica do armazenamento em CD do PS1? Será que dois discos, como no caso de Valkyrie Profile, conseguiriam dar conta do recado com as dublagens? Quem sabe...


SISTEMA (7,1)



Ok, antes de começar eu já vou avisando logo que este será o maior (e derradeiro) tópico do post, como de costume. Também é necessário o aviso de que Alien Resurrection é UM DOS JOGOS MAIS DIFÍCEIS DA HISTÓRIA DOS GAMES, mesmo se jogado na dificuldade easy (meu caso). Sendo assim, saiba que este jogo lazarento de difícil é para poucos. E não, não estou querendo me gabar dizendo que sou o fodão. A intenção aqui é alertar que, caso você desista de jogar por perceber que esse tipo de experiência masoquista não é a sua praia, ninguém vai te julgar por causa disso. Entendeu, seu franguinho covarde usuário de Game Shark da porra? Ótimo, podemos começar...

A franquia Alien como um todo se passa em um mundo-cão dos infernos no qual o ser humano só faz se ferrar o tempo todo. Então, nada mais justo que os jogos dessa franquia não sejam lá um passeio no parque condescendente com jogadores mais frouxos, concorda? Ahhh, não acredita que Resurrection seja um jogo tão impossível assim como eu descrevo? Então me responda: que outro FPS que você conhece ESCONDE A PRIMEIRA ARMA DO GAME ao invés de fazer com que sua coleta seja obrigatória? Heim? Heim?

Eu esperando ganhar uma Smartgun e é ISSO que eu recebo?

Sim, é fato que existe o recurso de uso automático de medkits, caso você esteja em seu juízo perfeito por selecionar o nível fácil de dificuldade. Mas em geral, Resurrection é bem escuro, seus inimigos são implacáveis e atacam de surpresa, dando pouca chance de reação ou improviso na hora que o bicho vai pegar. Falando em bicho, os inimigos, sejam soldados, facehuggers ou aliens, surgem do nada e a qualquer momento, tornando os combates em 99% dos casos letais e imprevisíveis.

Aliás, falando em facehuggers, eles possuem um “novo” sistema de dano que precisa ser salientado no post. Nos jogos anteriores dessa série (como no Alien 3 de SNES ou Alien Trilogy do PS1), quando uma aranha grudava na sua cara, ela baixava certa quantidade de vida sua e você seguia de boas, matando xenomorfos a torto e a direito. Se você assistiu ao menos ao primeiro filme sabe como isso é uma coisa nada a ver da porra. Em Resurrection esse problema foi corrigido, finalmente.

Quando um facehugger te encontra, ele gruda na sua cara e a tela fica escura. Uns segundos depois você acorda, o bicho está caído ao seu lado e uma barrinha com um símbolo de alien fica abaixo da sua vida, esvaziando aos poucos. Quando chegar ao final... acho que não preciso explicar o que acontece, não é?

É isso que acontece quando você demora a entender o sistema de jogo...

O motivo das aspas no adjetivo novo, no começo do parágrafo acima, é que isso nem de longe se configura como uma novidade ao universo de alien. Muito pelo contrário: é dessa forma que sempre devia ter sido, caso os jogos de videogame tivessem a obrigação de serem 100% fiéis ao material de origem no qual se inspiram.

“Mas Shadow, existem milhares de ovos de alien espalhados pelo cenário. Você está querendo me dizer que é preciso terminar o jogo sem ser pego por uma aranha o jogo inteiro? ” Claro que não, troll da internet. É aqui que entra a beleza no sistema original de Alien Resurrection...

Lembram do que eu sempre falo nos posts dessa franquia, de que os personagens vão enfrentar os aliens sem estarem preparados pro que vão encontrar? Então, aqui a Argonaut deu um passo à frente na série e inventou o P.A.U, ou Portable Autodoc Unit, um aparelhinho da hora que emite um pulso radioativo pra eliminar corpos estranhos do seu organismo.

Quando acordar, já sabe: ou leva pau ou morre!!!

Sim, eu sei que matar um chestburster com uma onda de radiação é uma baita forçação de barra, mas essa é uma novidade mais que bem-vinda e que faz todo sentido no universo alien (principalmente se você parar pra pensar que a USM Auriga foi preparada para lidar com o organismo).

Aproveitando o ensejo e a certeza de que você vai topar com uma sala cheia de facehuggers e será pego por eles de qualquer jeito, aproveito pra dar a dica de só usar o Portable Autodoc Unit pra remover o chestburster quando tiver dado cabo de todos os outros que estiverem em uma área (respeitando o limite de tempo, claro), visto que você ficará imune a grudadas na cara enquanto o visitante estranho estiver dentro de você.

Todavia, o fato de você poder usar o Pau (pensou mesmo que eu deixaria esse trocadilho passar?) não vai facilitar a sua vida nem um pouco, dadas as dificuldades que este jogo insano tem guardado pra te enlouquecer. Imagine jogar um FPS onde cada cantinho escuro, cada caixote solto no cenário pode significar uma tela de game over com seis patas, pronta pra pôr todo seu progresso a perder?

Entrando pelo cano numa nave espacial do barulho!!!

Então, fica mais essa dica: se estiver borrando as calças, com o coração e o fiofó na mão, use o pau que estiver mais perto de você que tudo acabará bem (desculpem, não consegui resistir de fazer esse trocadilho novamente...). Além da bem-vinda remoção de corpos estranhos, há novos elementos não existentes na série, como os campos de força, que foram tão bem utilizados e colocados nos ambientes de forma natural que você nem vai se dar conta de que eles foram “inventados” para o game em questão.

Já que o tópico também são os facehuggers, quero deixar documentado o queixume de que não faz o menor sentido as aranhas continuarem te atacando (elas causam dano se chegarem perto) mesmo depois que você já está incubado, ou o fato de as aranhas ficarem perambulando a esmo, fora dos ovos, pelos cenários à procura de uma vítima. Essa falta de cuidado com esse detalhe lógico destoa muito do esmero com os outros aspectos do game, além de ir contra a função vital desses organismos.

Ainda sobre essas adoráveis criaturinhas, atesto que Resurrection conseguiu transplantar para o jogo a periculosidade desse organismo como ele é retratado nos filmes. Aqui o facehugger é o inimigo mais perigoso do jogo, pelo fato de que você morre instantaneamente se não tiver um pau na retaguarda. Droga, eu ainda não consegui me desapegar dos trocadilhos fajutos...

"Pessoal, o chefe mandou avisar que o horário de almoço acabou".

Sim, é fato que às vezes eles dão o maior vacilo, tentando grudar na sua cara de longe, sem contar que são os inimigos mais frágeis em questão de dano. Mas não duvide disto nem por um segundo: algumas das situações mais cabeludas do jogo incluem esses filhos da mãe no roteiro: que tal atravessar um corredor cheio de raio laser enquanto foge de um deles? Tenso, foi o que eu pensei...

Em tempo, acho que o facehugger é o bicho mais FDP já inventado pela ficção, vamos combinar. Como se sua função biológica de troll master não fosse o bastante, o jogo faz questão de forçar situações de gameplay onde você não tem saída a não ser se ferrar nas garras deles, como no subir e descer de escadas.

Voltando sobre o mimimi com os detalhes (que provavelmente só um louco pela série como eu deve ter notado), o sangue ácido dos aliens não causa dano nos personagens humanos como Distephano, Call ou Christie. Parece loucura cobrar mais dificuldade num jogo que foi feito pra te enlouquecer de raiva, mas o ácido machucava já no Alien Trilogy, do mesmo PS1, então...

Falando da experiência como FPS em si, Alien Resurrection é, fácil fácil, um dos jogos de tiro (quiçá jogos como um todo) mais difíceis que eu já joguei na vida. Pra começar, não há espaço pra enganos: existe uma névoa de tentativa-e-erro pairando no ar que permeia cada cômodo dos cenários, onde conseguirá sobreviver aquele jogador que memorizar melhor a ordem de eventos do jogo.

Enquanto uns tão levando pau, outros tão subindo pelas paredes. Nossa,
as piadas desse post tão a maior baixaria, heim seu Shadow?

Você poderá jogar com quatro personagens presentes no filme (Ripley, Distephano, Call e Christie), mas isso pouco fará diferença: exceto pelo arsenal, praticamente não há nuances de jogabilidade entre os sobreviventes (muito embora que pequenos detalhes, como a ausência do localizador por movimento, variem entre eles). A mira, por sua vez, é bastante democrática: É HORRÍVEL PRA TODO MUNDO DE FORMA BASTANTE HOMOGÊNEA.

Ela (a mira) é imprecisa e dificulta bastante a jogabilidade, mesmo que você baixe a sensibilidade ao valor mínimo. É possível causar mais dano nos inimigos acertando pontos como a cabeça, mas dificilmente você terá tempo de ajustar a posição do cursor no meio do desespero que são os combates desse jogo. A mira das armas é tão problemática que você precisa ajustar a altura da retícula antecipadamente aos inimigos, pois se for fazer isso no calor da batalha, provavelmente vai errar e tomar uma cachoeira de ácido e dano.

E não se deixe enganar: Resurrection é um survival dos brabos. Mesmo no nível easy (que, definitivamente, não corresponde ao nível fácil visto em outros jogos) você vai passar apertos inimagináveis diante das situações preparadas pelos sádicos da Argonaut (lembra da parte da água, no filme? Pois é...). Nesse jogo cada bala conta, e gerenciar seus itens, uso da arma apropriada e saber quando fazer backtracking ao save point (eu já mencionei que não há mapa nesse jogo?) fará a diferença entre um console íntegro e um PS1 arremessado na parede do seu quarto, após um ataque de fúria.

Difícil é decidir qual a melhor arma desse jogo.

Mas, se por um lado a mira é ruim, as armas presentes no game são fabulosas. A reles pistolinha single de Ripley já dá conta das aranhas e de um ou outro alien sozinho nos cenários, dada a distância suficiente para matá-lo. A shotgun (aquela usada pelo cadeirante na cena do alien no teto), arrisco dizer, é a melhor de todos os FPSs que já joguei. O rifle laser de Call vai te fazer sentir vontade de aplicar um cheat de munição infinita, só pra sentir um pouco do gostinho da felicidade em um game escabrosamente difícil.

Acho que, assim como Quake, Alien Resurrection foi um dos poucos FPSs no PS1 a ter o recurso de olhar pra baixo e pra cima com a mira. O problema, como já falei, é que a movimentação da retícula é tão dura e pouco ajustável que, mesmo dando toques sutis no analógico direito, ela vai correr como louca pela tela e errar o alvo que você está tentando acertar.

Parece muita liberdade pra um jogo que foi lançado apenas sete anos depois de Doom, um outro jogo em que a mira consistia, primordialmente, de olhar para frente e acertar inimigos em diferentes níveis, às vezes a cem metros de distância, com uma shotgun de cem balas que não tinha necessidade de recarregar. Mas não vá pensando que liberdade de visão vai resolver a sua vida neste jogo.

Ripley tentando um high ground...

Via de regra, desista de tentar subir em lugares altos pra tirar proveito do fato de que os aliens não sobem andares diferentes de onde apareceram: seus disparos não passam por brechas de grades e portões, não importa o tamanho dos espaços. Os aliens, por sua vez, se escondem em ângulos inalcançáveis por seus tiros de uma forma tão escrota que quase me fez sentir vontade de entrar no jogo pra matá-los com minhas próprias mãos. E olha que eu quase ia me esquecendo de falar que a mira, mesmo com a ajuda da alavanca direita, só desce ou sobe até um certo nível (dê adeus ao seu fetiche de olhar pros pezinhos delicados da Ellen Ripley).

Pra continuar o tópico Sistema eu preciso falar de alguns detalhes esparsos que não se encaixam muito em outros momentos do texto. Vamos lá: lembra do “fator Doom” nos FPSs que eu sempre comento nos textos, aquele onde você coleta um item no cenário e brotam inimigos nas suas costas? Então, eu podia descrever Alien Resurrection com essa frase apenas e tirar férias do blog pelos próximos trinta dias, se assim eu desejasse...

É verdade que alguns vícios desse gênero, que foram fortemente estabelecidos por Doom e Half-Life, são atenuados com o avançar das fases, mas isso não quer dizer que Alien Resurrection fica mais fácil por causa disso.

"E agora: arrisco de procurar um save ou volto e tento a sorte no módulo de fuga?"

Sobre os save points, cabe lembrar que o maravilhoso Alien Isolation foi acusado (injustamente) de escassez de pontos de save, em seu lançamento em 2014. Não, você não leu errado. Estou falando do Isolation mesmo, não do Resurrection. O motivo da comparação é que o Resurrection sim é que conta com uma escassez absurda de save points.

Muitas vezes você vai passar mais de 40 minutos de jogo, ao risco de morrer a qualquer minuto, e não vai topar com nenhuma dessas maquininhas da felicidade e redução de estresse. Noutras, dois ou mais save points na mesma área vão te fazer soltar o comentário (justificado) de que os sacanas poderiam ter tornado a sua vida muito menos sofrida se colocassem mais pra trás um save que apareceu muito perto de um outro. Mas acho que o conceito de facilitar a vida do jogador foi algo que passou longe do prédio da Argonaut durante o desenvolvimento desse game...

A atenção aos detalhes que faltou em alguns elementos de gameplay já citados (como o dano por ácido ou os facehuggers maratonistas) e os não citados (o facehugger grudar na cara de Ripley, que seria o equivalente a ele atacar um alien que estivesse passando por perto...) foi compensada em alguns outros momentos bem legais do gameplay. Por exemplo: se você tentar passar por um corredor eletronicamente trancado enquanto estiver incubado, um aviso de “presença não humana detectada” vai soar e impedir seu progresso (dica: pau nele!!!).

Tá de boas. É só passar pelo cantinho...

Não posso encerrar esse tópico final sem falar dos bugs e de um caso em especial que aconteceu comigo. Sobre os glitches, eles acontecem, inevitavelmente. Na batalha contra a Alien Rainha (jura que você acha isso um spoiler, a essa altura do campeonato?) surgiu um alien comum que simplesmente se recusava a morrer. O filho da mãe levou mais de 15 tiros certeiros de shotgun e não tombava, me obrigando a carregar o save novamente. Em um ou dois momentos também vai acontecer um respawn infinito de aliens, e nessas horas só posso te aconselhar a seguir avançando e matando eles sem olhar pra trás, até mudar de cenário e rezar pro bug ser corrigido pelo game.

Também acontece de alguns facehuggers se recusarem a pular na sua cara, ou ovos que não abrem quando você chega perto. Esses bugs podem ser considerados como... quer saber de uma? Bug é o caralho!!! Num jogo filho da puta como esse, um inimigo não querer te atacar só pode ser considerado algo no nível de compensação divina, não uma falha propriamente dita.

E o caso especial que eu tinha pra falar? Bem, esse aí é mais específico de quem joga jogos originais de PS1 no PS3: logo no começo do jogo alguns botões de ativar porta se recusavam a funcionar. Depois de sofrer recomeçando o jogo umas dez vezes, eu finalmente fui procurar em fóruns e descobri que o problema é da emulação que o PS3 faz pra rodar esses jogos em retrocompatibilidade. Isso é uma pena, pois o visual dos games de PS1 no PS3 “sofrem” uma melhora significativa. Se jogar Alien Resurrection no PS2 a melhora, acredite, é maior a ponto de tornar os visuais quase irreconhecíveis, e pra melhor (o problema é que você precisará de um memory card original de PS1 pra salvar o progresso...).

Zero de munição e life no bico: um dia corriqueiro na vida de Ellen Ripley...

E se teve algo de positivo nessa novela toda pra rodar o jogo da melhor forma possível é que eu descobri algumas diferenças entre os níveis de dificuldade do jogo (eu arrisquei de colocar nos níveis mais altos por saber que não ia continuar dali mesmo). Por exemplo: na parte de liberar o módulo salva-vidas que está enguiçado, com Call, jogando no Normal você precisará pegar 4 propulsores para ejetar o módulo (dois a mais que no nível easy, muito embora que neste nível haja uma contagem de tempo).

Eu confesso que adoraria rejogar o game no normal (e até no hard) pra vivenciar cada diferença nos objetivos e jogabilidade. Mas, sem a utilização de um cheat de vida ou munição infinita, é desnecessário dizer que Alien Resurrection não é o tipo de jogo que te convida a “passear” pelos seus cenários debaixo de dificuldades mais altas.

Pra finalizar o tópico, vou compartilhar algumas impressões sobre os momentos finais do jogo. Primeiramente eu queria agradecer a Argonaut por não ter colocado uma batalha contra chefe final que fosse estressante e exageradamente difícil. Acho que já deu pra entender que dificuldade alta é um fantasma que assombrou cada momento da minha experiência com esse game, então não havia razão pra torturar o jogador mais ainda no final.

Segundamente, a sequência final, onde o Newborn começa a aparecer pra nos matar, é uma das mais tensas que eu já enfrentei num jogo. Sim, é tensa pelos motivos que ainda vou explicar mais abaixo, mas o crédito de retratar o terror de estar no mesmo cômodo que aquele bicho horrendo dos infernos precisa ser dado a Argonaut em tempo. Felizmente é nessa parte também que ganhamos a Eletric Gun, de longe a arma mais útil de todo o jogo.

O jogo acha que tá fácil demais e coloca essas porras dessas turrets pra te matar.

O problema desse trecho final é que nós acordamos com Ripley, depois de ser ridiculamente abduzida por um alien, e estamos sem o localizador de movimentos. A Auriga está indo pro saco, então seremos atormentados por blackouts, correntes elétricas causando dano quando você passa e contamos apenas com duas armas (a outra é a shotgun) pra lidar com a caralhada de inimigos que vão aparecer pelos caminhos em linha reta até o galpão onde a Betty se encontra.

Nessa hora, prepare-se. Lembra-se do que eu falei sobre save point mal localizado, ora faltando ora sobrando? Então, esse é um dos problemas dessa parte. Toda a mesquinhez de quem mantém como refém um jogador ávido por finalizar um game sofrido virá à tona por parte dos doentes mentais da Argonaut. Dando nome aos bois: em uma sala com nada menos que CINCO facehuggers, os programadores deixam como sua única rota de fuga um corredor apertado e escuro. Se você tentar voltar, raios elétricos são ativados nas suas costas só pra te lembrar do quão maliciosa pode ser a mente de um ser humano.

A única coisa boa nessa sequência final, se é que dá pra interpretar assim, é a linearidade dos cenários: são vários corredores, quase intermináveis, lotados de inimigos em cada centímetro quadrado que você avance. Um teste literal de paciência pra ver quem consegue sobreviver às intempéries do rigoroso universo de Alien. Pelo menos o jogador não poderá dizer que foi pego de surpresa...


UM JOGO MUITO BOM DE UM FILME MUITO RUIM...



A essa altura do post você já deve ter se dado conta de uma coisa que não se faz necessária explicar com palavras, mas que eu farei mesmo assim: Alien Resurrection é um jogo para poucos. Um jogo para sobreviventes, eu arriscaria dizer. Mesmo no nível mais baixo, é um dos jogos de tiro mais difíceis da póstuma geração dos 32-bits.

Não é o tipo de jogo que você pode tirar sarro com a cara das ameaças encontradas, ou proveito de seu sistema pra sacanear os inimigos: é VOCÊ a vítima nessa história toda e quem tem mais a perder. É VOCÊ quem deve andar com máxima cautela pelos cenários. É VOCÊ quem está numa situação de bosta da qual poucos conseguiriam escapar com vida. ESSA é a mensagem que eu quero acreditar que a desenvolvedora do game quis passar ao criá-lo, a fim de não perder a minha sanidade ao pensar sobre a alta dificuldade do jogo.

Alien Resurrection para PS1 é um jogo o qual você completa mais pelo desafio e pela superação pessoal de saber que poder aguentar qualquer agrura digital planejada pela cruel mente humana. Você não joga esse jogo por diversão. Não é o tipo de game que você coloca pra relaxar depois de um dia de trabalho estressante. É mais como um compromisso, uma tarefa árdua que você aceita mais pra conhecer seus próprios limites, algo bem na linha da franquia Souls.

"Ai, Shadow, sua rainha do drama!!! O jogo nem é tão difícil assim!!!"

Junto com o primeiro Half-Life, Alien Resurrection foi um dos jogos mais mesquinhos e mal-intencionados que eu já vi, projetado propositadamente pra ferrar com o jogador em cada minuto de seu gameplay que eu já tive o ____ de jogar (insira o substantivo de filhadaputice que achar mais adequado na linha ao lado).

Terminar esse jogo sem qualquer tipo de cheat ou guia é olhar na cara do impossível e mandar um belo FODA-SE na fuça dele. É saber que é foda no que faz, ao menos no tocante a jogos de videogame programados pra fazer o jogador arrancar os cabelos de desespero. De forma alguma falo isso pra me gabar, pra me achar o máximo. Muito pelo contrário: em vários momentos eu pensei em largar o jogo e ir jogar Barbie e o Resgate dos Filhotinhos no nível very easy, pra desopilar os pensamentos ruins. Mas meu compromisso como fã absoluto dessa série falou mais alto e eu perseverei.

NOTA FINAL: 7,9

É sério: a experiência com esse jogo é tão causticante e nervosa que fica até difícil levar o fator Diversão em consideração ao analisar sua conjuntura friamente, depois que a raiva e o desespero nos momentos de dificuldade passaram. Acabar esse jogo é tirar um peso das costas ao enfrentar mais de 12 horas de hordas de inimigos que bastariam pra filmar umas duzentas trilogias da série Alien. 

O mais difícil nesse game? Aguentar a desculpa do clone da Ripley duas vezes...

Sendo assim, fica a dica honesta de jogador de games para outros jogadores de games: se não for fã da franquia, PASSE LONGE DESSE JOGO DOS DIABOS. Não pela sua qualidade, longe disso. Resurrection é um dos jogos mais bonitos e tecnicamente bem-executados que você encontrará na geração do PS1. Mas acredite: se você não é um fã da série ou não quer conhecer um pedacinho do inferno antes mesmo de morrer, Alien Resurrection deve ser evitado por você a qualquer custo...


Au Revoir.

quarta-feira, 15 de novembro de 2017

DANDO ADEUS A: FIST OF THE NORTH STAR (PS3)






















Hokuto no Ken é uma série japonesa que provavelmente é receitada em consultórios psiquiátricos àqueles pacientes que chegam com dúvidas sobre sua própria masculinidade. Datado da década de 80, a série de anime conta a história de Kenshiro, um japonês de 1,90m de altura e com ombros maiores que a cabeça de um ser humano adulto saudável. Kenshiro tem a mania de rasgar sua própria camisa (pra exibir um peitoral anatomicamente impossível) toda vez que alguma pessoa indefesa está sendo molestada por um meliante e, apesar de falar pouco e não ter muitos amigos, ele possui um senso de justiça inabalável e não suporta assistir ao sofrimento de inocentes.

Ah, também tem o pequeno detalhe de que, nessa história, o mundo foi destruído por bombas nucleares, os mares secaram e toda a vida do planeta parece ter sumido do mapa (exceto pela espécie humana), mas te aconselho a não levar a lógica muito em consideração quando for acompanhar essa série, pro bem da sua própria sanidade mental...

Se você acha que obras como Dragon Ball Z ou Cavaleiros do Zodíaco são exageradas e trazem absurdos aos quilos em seus episódios, só pode significar que você não conhece o Punho da Estrela do Norte, uma das séries mais influentes da cultura pop japonesa. Só pra te dar uma ideia: além dos animes citados acima, Hokuto no Ken serviu de inspiração pra milhares de outras fontes das quais provavelmente você não fazia a menor ideia, como Street Fighter ou... cara, Hokuto no Ken é aquele tipo de obra que parece permear cada ramo do entretenimento atual de uma forma quase onipresente, então apenas assista e saia contando as referências que conseguir localizar nos episódios pra me poupar desse trabalho.

Kenshiro cunhou o termo "poser" quando ninguém fazia ideia do que isso queria dizer.

Sim, eu sei que a série se inspira fortemente na franquia Mad Max, e que faz referência visual a várias figuras famosas da cultura popular mundial (acho que a banda Twisted Sister deve ter se sentido ou homenageada ou plagiada com a aparência dos punks e inimigos enfrentados por Kenshiro durante o anime...). Mas Hokuto no Ken possui toneladas e mais toneladas de bizarrices tipicamente japonesas que nunca veríamos em outro lugar senão o Japão. Por exemplo, o protagonista Kenshiro.

Kenshiro é um praticamente da arte milenar Hokuto Shinken. E falar das coisas que o protagonista faz no anime, apenas utilizando essa “técnica”, é como tentar descrever um canivete suíço pra uma pessoa que não enxerga, não ouve e não possui tato. Então, só pra dar um gostinho dos milagres que o Hokuto Shinken opera, basta dizer que Kenshiro consegue, entre outras coisas: explodir cabeças; quebrar colunas ao meio; imobilizar o inimigo; parar seu coração; curar cegueira; entortar barras de ferro; parar armas brancas com as mãos; e muitas outras loucuras das quais não me recordo agora.

Kenshiro e sua técnica do Honkuto Shinken são praticamente invencíveis. Eu assisti a apenas 14 dos mais de 100 episódios que a primeira fase do anime possui, mas não é exagero dizer que o protagonista enfrenta dúzias de oponentes sem sequer ser levemente desafiado nesse meio tempo. Falando assim parece ser algo meio tosco, mas uma das graças do desenho é assistir as formas de execução que com as quais Kenshiro vai dar cabo do seu inimigo, antes de proferir uma das mais célebres frases da história dos desenhos japoneses: Omae wa mou shindeiru (você já está morto).

Apenas cem cadáveres: um dia de movimento fraco na empresa Kenshiro Corporation...

Lembra do golpe dos Cinco Pontos, do Pai Mei (Kill Bill)? Lembra daqueles momentos nos Cavaleiros do Zodíaco, onde os personagens têm seus corpos perfurados por dedos ou um lutador abandona a batalha porque seu oponente já foi derrotado e nem se deu conta disso? Então, todas essas tosqueiras da narrativa japonesa já podiam ser encontradas desde 1983, em Hokuto no Ken.

Então, dada a fama e influência deste... peculiar anime, nada mais óbvio que a franquia ganhar várias versões para videogames de todas as eras possíveis e imagináveis. Claro que eu não vou listar aqui cada aparição dos trapézios plus size de Kenshiro nos games, então só posso adiantar que o texto abordará a minha experiência com o único game da franquia o qual eu tive o (des) prazer de experimentar, o Fist of North Star: Ken’s Rage.
Sem mais enrolação, vamos aos motivos que me fizeram desistir de jogar o Punho da Estrela do Norte, lançado em 2010 para Playstation 3 e Xbox 360, ainda nos primeiros 20 minutos de gameplay.


A GUERRA NUNCA MUDA...




















Em 2009, ao menos no Playstation 3, eu já jogava games com visuais maravilhosos de pelo menos um ano de idade. Entre esses, posso citar Resident Evil 5, Dead Space, Bioshock e Street Fighter 4. Então, o que devemos esperar de um jogo de 2010 com mecânicas simples de gameplay e cenários em linha reta lotados de paredes invisíveis? Nada mais que um deslumbre visual, concorda? Isso é tudo que este jogo NÃO vai entregar...

O tutorial e o modo história são praticamente a mesma coisa: Kenshiro andando lentamente (e batendo lentamente também) por corredores lineares enquanto enfrenta hordas de meliantes genéricos que passam o tempo brincando de upa-upa cavalinho com camponeses indefesos. Se a repetição dos combates fosse regada a lutas divertidas, bem-ilustradas e à altura do gore do desenho, eu ficava calado. Mas não é o que acontece.

Quando não estiver assistindo, pela décima vez, o desabar de uma coluna de pedras que barrava o caminho de Ken, o jogador provavelmente vai estar desviando de uma parede invisível ou tentando ajustar a câmera pra enquadrar o ângulo certo. Os cenários, além de lineares, são feios e repetitivos: boa sorte ao tentar discernir montanhas de escombros de uma carcaça de caminhão destruído.

Kenshiro é tão lento que leva horas pra derrotar o chefe do tutorial.

Ken, por sua vez, conta com "lindas" estrias em baixa resolução que não condizem com a anatomia de um cara que possui mais músculos no corpo do que a biologia permite, visual pobre esse que torna os combates de beat’em up pouco interessantes e desmotivantes de se assistir (e se executar). Os oponentes, ao serem mortos, flutuam no ar com uma ridícula cabeça de balão que deveria representar aqueles momentos legais no anime, onde crânios explodem sem a menores preocupações com faixa etária.

Ainda na parte dos visuais, em apenas 20 minutos de jogo (foi o máximo que a minha fisiologia de adulto de 35 anos conseguiu suportar) eu consegui encontrar um erro de tradução grotesco, digno de quem não faz ideia do material fonte com o qual está trabalhando: Bart, o garoto mau caráter e pentelho que só pensa no próprio bem-estar, virou Bat, o menino-morcego. Se por cegueira ou tentativa de adaptação eu não sei, mas esse tipo de amadorismo faz com que um produto de baixa qualidade caia ainda mais no meu conceito quando eu me deparo com um game desconhecido.

Você não faz ideia da demora que leva pra Ken agarrar um oponente nesse jogo.
E os efeitos de resolução 4K são de fazer chorar...

A parte sonora do game é praticamente uma “Ivete Sangalo no Rock in Rio”: alguns diálogos são extremamente baixos, antecipados por um grito súbito que vai diminuindo de volume conforme a linha de conversação progride. É possível escolher o áudio original japonês com legendas em inglês, o que eu sinceramente duvido que vá melhorar em alguma coisa sua (má) experiência com o jogo. Em outros trechos, parece que estamos jogando um game sobre cinema mudo. As razões para tal comentário são autoexplicativas...

Quando não está te enervando com diálogos quase inaudíveis, Hokuto No Ken está enchendo seu saco com um rock genérico, durante os combates, capaz de deixar entediado até o aborrescente mais fã de Slipknot. Pra piorar, o ritmo lento das batalhas simplesmente não condiz com as faixas tocadas, sendo que na pausa e em outros momentos o jogo toca temas, como nos jogos da série Fallout, que quebram totalmente a identidade musical planejada para o jogo.


SEU CÉREBRO JÁ ESTÁ MORTO E VOCÊ NEM PERCEBEU...
























É incrível como um jogo consegue reunir tantos problemas e baixa qualidade logo em seus primeiros 20 minutos. Falando do ponto de vista de colecionador, Hokuto no Ken é o típico jogo que você adquire apenas pelo seu valor como raridade, destoando de surpresas mais que bem-vindas (como Afrika ou Majin and the Forsaken Kingdom) que te despertam a alegria de desenterrar joias raras do console para o qual você decidiu colecionar.

É um jogo extremamente repetitivo, linear e com combates sem graça, que não fazem jus à fodice do protagonista do anime e ainda consegue fazer o jogador desistir de achar que é possível adaptar uma obra com fidelidade de forma que ele não queira se suicidar de tédio logo depois que a introdução do jogo terminar.

Fist of the North Star: Ken’s Rage possui uma continuação, que eu ainda não adquiri pra minha coleção. Se seguir a mesma linha do primeiro, já sei o que fazer: testar o disco por dez minutos, pra ver se o vendedor não me passou gato-por-lebre; higienizar a caixa e o manual do game e engavetar o título apenas pra engordar as fileiras da minha coleção. Pelo visto, a franquia Hokuto no Ken segue a mesma linha de séries como Gundam ou Dinasty Warriors: são jogos extremamente repetitivos, que exigem do jogador que ele desligue seu cérebro e coloque o dedo polegar no piloto automático, apertando o botão de ação até que todos os inimigos caiam. No desenho, que não requer interatividade, isso pode ser divertido, acredite. Já em um jogo...


Au Revoir.