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sábado, 1 de setembro de 2018

ANÁLISE: CHOCOBO'S DUNGEON 2




















Você conhece a franquia Final Fantasy? É uma série de JRPGs que data da década de 1980. Nela, você controla personagens por meio de comandos pré-definidos que acionarão as mais diversas habilidades, como usar um item de cura, lançar um feitiço num inimigo ou (tentar) fugir da batalha.


Falando em fugir de batalhas, a franquia, desde seu lançamento, é famosa por seus combates aleatórios e alta taxa de encontro com monstros no mapa e cenários. Funcionava assim: você estava lá, andando pelo mapa ou por uma dungeon nada amistosa, quando de repente um efeito de alguém puxando a descarga distorcia a imagem da sua TV e os sopapos entre goblins e black mages começavam.

Além da aleatoriedade, pra piorar, os encontros podiam ser bastante desbalanceados, com monstros de nível muito superior ao seu trancando o acesso a certas áreas do jogo pelo simples fato de conseguirem te derrotar em poucos turnos. Não é à toa que muitos desistiam do jogo: um mundo aberto com perigos randômicos e sem muita instrução do que era preciso fazer pra avançar não era lá muito convidativo para crianças de uma era pré-internet ou guias estratégicos.

Se você nunca jogou, não faz ideia da alegria que era subir num desses...

Mas toda essa sofrência estaria para ser amenizada com o lançamento do segundo jogo, Final Fantasy 2, e a chegada da ave emplumada mais querida da indústria dos games: o Chocobo permitia cruzar distâncias no mapa-múndi com maior rapidez, e o melhor de tudo: SEM ENCONTROS COM INIMIGOS. Claro que era preciso encontrar uma floresta onde o bicho habitava e subir no seu lombo (ele era tão arredio que ia embora assim que você descia).

Depois dessa longa introdução sobre o passado da série e origem do Chocobo, agora eu acho que ficou mais fácil compreender o motivo dessa ave de montaria ser um dos personagens secundários mais amados da franquia Final Fantasy. E com a popularidade vem a fama: em dezembro de 1997 a até então prolífica Square Soft lançava o Chocobo No Fushigi Na Dungeon. O motivo do título da primeira aventura do Chocobo estar em japonês é que o título nunca foi lançado fora do Japão (que eu saiba).

Com a maior popularização de Final Fantasy como um todo no mercado ocidental, a (ainda) Square Soft lançaria o Chocobo’s Dungeon 2, no ano de 1998 no Japão e um ano depois, nos EUA. Como era de se esperar, eu nunca consegui jogar o primeiro dos dois jogos, então só posso analisar o segundo, o qual eu conheço de cabo-a-rabo e pretendo compartilhar minha experiência com os leitores aqui do Mais Um Blog de Games.


HISTÓRIA (7,5)


Antes de tudo, é preciso dar alguns avisos. Como se trata de um spin-off, CD2 não tem a menor obrigação de seguir a estrutura narrativa (e de gameplay) encontrada nos jogos da série Final Fantasy. Fica mais do que claro, logo na abertura do jogo, em belíssimo CGI, que este jogo é mais voltado para crianças e pré-adolescentes, então nada de triângulos amorosos entre pessoas de cabelo espetado, mulheres sendo atravessadas por espadas quilométricas ou meteoros que vão acabar com toda a vida na Terra.

Falando em história, é bastante claro que o humor foi o tempero principal escolhido para apimentar as aventuras do Chocobo e seu amigo Mog. E é com felicidade que revelo que ele (o humor) está no mesmo nível de jogos como Super Mario RPG ou Radiata Stories: é fundamentado no mais puro desapego com a realidade e nonsense japonês da mais alta qualidade.

Já nos momentos tutoriais do jogo você (provavelmente) vai rir feito um bobalhão com as trapalhadas muito loucas do Chocobo e sua turma (sim, essa frase foi proposital, caso você tenha desligado seu sensor de sarcasmo). Ela, a história, já começa de forma inesquecível e hilária, logo na intro em CGI, com o Chocobo sendo perseguido pelo Behemoth numa sequência que, depois, descobrimos ser apenas um pesadelo do bicho emplumado (sério: não consigo deixar de rir toda ver que vejo o Mog sendo esmagado por Behemoth).

Alguém vai se dar muito mal neste sonho...

Mesmo com toneladas de leveza e descompromisso com a seriedade, o enredo do jogo tem seus momentos grandiosos e até alguns bem tristes, podendo fazer escorrer uma lagriminha se você for dos mais sensíveis (a cena da neve, sim, é dela que estou falando).
Não espere por um enredo intrincado, com grandes reviravoltas sobre guerreiros lendários ou algo do tipo, mas fique tranquilo com a história de CD2: ela é boa o bastante pra te fazer sentir vontade de terminar o jogo pra ver o que vai acontecer.

Quando se leva a sério e deixa um pouco a galhofa de lado, o game conta uma linda história sobre tolerância, perdão e respeito ao próximo, sendo uma excelente fábula para os pimpolhos menos acostumados a enredos complexos sobre viagens no tempo ou calamidades que vêm do céu, se é que você me entende. Mas ela também vai agradar a pré-adolescentes e adultos bobalhões de coração mole (como eu), pode confiar.


GRÁFICOS (6,4) E SOM (9,0)


Chocobo’s Dungeon 2 não é o jogo mais bonito que você vai encontrar na geração dos 32-bits, longe disso. Mas ele é o típico caso onde você pode se arrepender por julgar um game pelo encarte: ele traz CGIs dignas do auge (da era de ouro) da falecida Squaresoft, com animações in-game muito fluidas e condizentes com o tom da série.

Os cenários e personagens são inspirados em um daqueles livros infantis de dobradura e visual SD (super deformed), com cabeças grandes e corpos pequenos. Os efeitos das magias e itens são bem coloridos e animados, com alguns deles inclusive se saindo melhor que jogos mais “sérios” da empresa (como Final Fantasy 7, pasmem).

É bem verdade que os gráficos podiam ser melhores: em certos momentos da aventura eles são bem simplórios e serrilhados. Entretanto, nem só de visuais é feito um jogo, então cabe a você deixar a primeira impressão negativa de lado e mergulhar nas aventuras do Chocobo de mente aberta.

Os emuladores deixam o visual um pouco melhor.

Como a maioria dos títulos da Square Soft, a parte musical do game é marcante, te fazendo cantarolar músicas ouvidas no game mesmo quando você não está jogando. De acordo com a Chocopedia (acabei de inventar!), a OST do game foi composta por Kumi Tanioka, Yasuhiro Kawakami, Tsuyoshi Sekito e Kenji Ito, com algumas faixas reaproveitadas do deus da game music Nobuo Uematsu. Ou seja: um time de completos desconhecidos que entendem que um jogo não precisa ser medíocre em seus aspectos técnicos só porque é um spin-off.

A música do CD2 pode ser considerada como excelente, visto que algumas faixas cumprem sua função e vão grudar na sua cabeça (pelos motivos corretos). Sons e efeitos sonoros também estão no mais alto padrão já conhecido pela Square. Jogue com o PS1 acoplado a um aparelho de som e seja feliz com os pios e chutes do Chocobo rebombando na sua sala (ou quarto).

AS faixas são caprichadas e passam o tom certo pra cada ocasião. Há um reaproveitamento incrível do tema do Chocobo, algo bem esperado de um spin-off desse naipe, que provavelmente resultaria num desastre sonoro caso essas mesmas faixas fossem criadas por qualquer outra desenvolvedora que não a própria mãe do Chocobo.



Em alguns momentos, a OST do game me lembra as músicas de jogos como Donkey Kong Country: uma qualidade “alta demais” pra um jogo “descompromissado”, que nem sequer segue a cronologia da franquia principal. E, depois de rejogar esse título à luz de games mais recentes, como Final Fantasy 15, eu fico me perguntando: por que a Square-Enix simplesmente não consegue mais alcançar esse patamar de qualidade nos seus jogos atuais? Será que Nobuo Uematsu carregava a Squaresoft nas costas tanto assim? Fica a pergunta sem resposta, pairando no ar como um Mist Dragon de nível 99...


SISTEMA (8,2)


O Chocobo zuero chegou pra chutar pra longe alguns paradigmas da série Final Fantasy. Pra começar, CD2 é um jogo de ação, diferente do seu parente de RPG por turno. Mesmo assim ele não abandona completamente suas raízes, utilizando um sistema camuflado de turnos o qual você vai precisar compreender pra não ter seu traseiro espancado logo nas primeiras telas do jogo.

É como se os personagens do game, tanto os que você controla quanto os inimigos, andassem nos quadradinhos de um tabuleiro de xadrez invisível. Se você se move, ataca, usa um item ou magia, sua vez passa e o inimigo tem a chance de atacar (ou fugir). Também é possível pausar o game ou trocar de equipamentos durante as lutas, mas não espere que os monstros fiquem esperando você trocar de cela sem fazer nada. 

Sem dúvidas, o mérito desse jogo reside no fato d’ele conseguir adaptar os elementos da franquia Final Fantasy (magias, invocações, itens e status) de forma convincente, que se adeque ao molde de jogo de ação com elementos de RPG: ao mesmo tempo que é fiel à franquia de origem, ele altera seu sistema na medida para se adequar às necessidades do formato (de RPG de ação).

Tirem as crianças da sala: nesse jogo a magia negra rola solta!!!

O resultado não podia ser mais divertido de se experimentar: é hilário poder fustigar inimigos arremessando itens neles ou chutá-los até a morte, momento esse em que soltarão um grito engraçado de despedida e, quem sabe, um pouco de gold pra engordar as finanças do Chocobo (ou um item completamente escroto que vai arruinar seus planos de exploração da dungeon...).

Em se tratando de dificuldade, lembre-se da nacionalidade dos criadores dessa série: Chocobo’s Dungeon 2 é um lobo em pele de cordeiro (ou seria corvo em pele de galinha?). De fato, o jogo é difícil num nível que eu o apelidei carinhosamente de “Dark Souls da Square, só que com penas”. É um jogo bem difícil se você não souber explorar as possibilidades do sistema. Pra ser sincero, é bem difícil MESMO que você seja um macaco velho (como eu) que já sabe o que fazer e como prosseguir num Dungeon Crawler desse tipo.

Definitivamente ele não é pra relaxar, a despeito do seu tom quase pueril. Não é uma daquelas experiências em que você joga metendo a cara, descuidado e não planejando e ainda consegue se sair vitorioso. Só pra citar um exemplo: nessa última jogada, pra escrever a análise, fui enfrentar o primeiro chefe sem evoluir meu personagem. O resultado foi que eu morri três vezes antes de conseguir vencer o bichão (leve em conta o fato de que eu conheço o game de cabo-a-rabo).

A side-quest do Marlboro bêbado: inesquecível.

Pra conseguir sobreviver sem virar jantar de ação de graças, é preciso aprender a domar o sistema e burlar as dificuldades impostas pelos sádicos da Square Soft. Talvez
assim você consiga se dar mal o mínimo possível e seguir avançando com a história. As armadilhas encontradas no chão dos cenários, por exemplo, podem destruir suas chances de vitória ou podem ser usadas pra sacanear aquele inimigo pentelho que não sai da sua cola.

Além do alto dano dos ataques dos inimigos, há um respawn deles a cada tela que você avança. Armas e acessórios equipáveis se desgastam e quebram, te obrigando a sempre levar consigo um par de cela e garra extras (mas você pode ganhar uma pena de magia ou invocação de Summon como prêmio de consolação pelo equipamento perdido). 

Também dá pra criar itens e atribuir os elementos que você bem quiser a eles (como veneno, fogo ou gelo). Pra amenizar um pouco suas baixas chances, as magias evoluem de acordo com o uso mas não requerem consumo de MP para ativar, lembrando o sistema de cargas do primeiro Final Fantasy (livros de magia precisam ser estocados e consumidos).

Você vai precisar de um depósito bem grande se quiser colecionar todas as essências de monstros.

Dungeons Crawlers como Diablo ficariam orgulhosos da galinha dos ovos de ouro que é o Chocobo’s Dungeon 2, dada sua liberdade de sistema. Por exemplo: você pode chutar um cartão de teleporte num inimigo muito forte, pra se livrar dele ou jogar um cartão de poison pra fazê-lo perder vida gradativamente. Se arremessar um item de encolhimento (seja um cartão ou um tônico) no seu alvo, talvez ele fique com ataques menos fortes e facilite sua vida no meio de vários outros oponentes que, com certeza, estarão tentando te cercar por todas as oito direções possíveis.

Pode-se dizer que CD2 entrega um sistema bem complexo e livre de combate e evolução de habilidades, fazendo inveja a muito RPG “sério” por aí. O gerenciamento de itens, por exemplo: logo na primeira dungeon você vai ficar abarrotado de itens (como em, adivinhou, Diablo...) e precisará decidir o que levar e o que deixar pra trás (muitas vezes sem saber do que se trata).

Como dificuldade pouca é bobagem, é preciso identificar itens e acessórios desconhecidos pra não quebrar a cara e tomar um tônico, quando de vida baixa, que vai justamente reduzir seu HP ou nível de Energy. E não pense que existe nada levemente parecido com autosave ou outras modernidades por aqui: morreu, perdeu tudo, a menos que use um cartão de save antes de subir ou descer um nível nas dungeons.

Às vezes você vai morrer porque Shiroma não quis te curar. Bela companheira essa...

Não se engane pelos gráficos fofinhos em sprites, pois CD2 é um survival dos brabos. Mesmo os galos velhos de briga como eu correm um sério risco de topar com a tela de game over com mais frequência do que gostaria. Entretanto, o game nos presenteia com uma curva de aprendizado deliciosa (isso se você souber lidar com um jogo que já começa no nível hard por padrão). O tutorial do jogo também ajuda muito: os seus companheiros vão ensinando os elementos de sistema com diálogos super divertidos que contextualizam as possibilidades do que você pode fazer ou deve evitar durante seu gameplay.

E já que falei de Companheiros, depois de finalizar o jogo é possível explorar as dungeons com os personagens que serviram de ajudantes (Cid, Mog, Shiroma e o bonequinho de pano). O problema é que, pra ver o final secreto do jogo, é preciso terminar as fases com todos eles, com o leve detalhe de que esses personagens têm todos seus níveis e itens resetados quando você morre ou deixa a fase. É, entendeu agora a metáfora do “Dark Souls com penas”? Dificuldade nível japonês de sandice...


PLUMAS AO LÉU...


Chocobo’s Dungeon é um jogo ultra obscuro que (provavelmente) nunca pisou em terras ocidentais. Sua continuação é um jogo tão obscuro quanto, mas que é possível encontrar ainda nos dias de hoje (tanto que minha jogada de análise foi com uma cópia original de Psone) ou jogar a versão em inglês via emuladores. E eu sei que existem outros jogos da franquia pros consoles da Nintendo, mas é triste ver como a Square-Enix deixou de lado uma série de tamanho qualidade e potencial (o Chocobo é uma das marcas registradas de Final Fantasy, ora bolas!!!).

NOTA FINAL: 7,8

Um ótimo jogo sim, mas que está longe de ser livre de falhas: sempre achei ele meio curto, mesmo pra uma aventura descompromissada de um personagem secundário. Também há certa repetição de algumas dungeons, bem como troca de cores (pallete swap) de uns poucos modelos de inimigos e chefes. Ainda assim, considero Chocobo’s Dungeon 2 um jogo indispensável àqueles que apostavam fortunas nas corridas de Chocobo do Final Fantasy 7 ou saíam à caça de tesouros de toda sorte no nono jogo da franquia.

O Mog vai te lembrar aquele (a) seu (a) ex: interesseiro (a), preguiçoso (a) e só fala merda!

Entretanto, fica o aviso aos que aceitarem o desafio: é incrível como um jogo tão doce em alguns aspectos (design de personagens, músicas e história) pode ser tão amargo e punitivo em outros (dificuldade no geral, aquisição de itens e progressão). 

É típico dos japoneses mascarar projetos diabólicos, construídos pra devorar o seu juízo, como meros jogos fofinhos feitos pra crianças jogarem. Sendo assim, não me culpe caso arremesse, de raiva, o controle do videogame na tela da sua TV LCD recém-comprada...

E por hoje é só, pessoal. Como estou de férias neste mês de setembro, esperem por mais análises em texto aqui no blog, bem como vasto conteúdo em vídeo no canal do Youtube e postagens na página do blog no Facebook (todos os links estão no topo da página, lado direito).

Au Revoir.

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