Em 2015, com a hype
absurda do Fallout 4, eu decidi que aquele (hoje longínquo) ano seria “o ano do
Fallout” aqui no Mais Um Blog de Games. O problema é que, ao decretar esse tipo
de festividade no site, eu acabo assumindo um compromisso que eu sei que não
vou cumprir (o simples peso do compromisso já me leva numa outra direção).
Sendo assim, eu decidi
que 2018 não seria o “ano do Castlevania” aqui no blog. Eu simplesmente botei
na cabeça que jogaria todos os jogos que meu ânimo permitisse e faria as análises
na medida do possível, no mesmo ritmo “devagar quase sendo expulso por
inatividade” que é bem típico do blog desde 2011 (seu aninho de estreia).
Mas qual seria a razão
para flertar com um possível “ano do Castlevania”? As respostas são duas: a
série animada da Netflix e a sombra do lançamento do Bloodstained que, pra quem
voltou de Marte agora, é o sucessor espiritual do Symphony of the Night, um dos
melhores Castlevania feitos por Koji Igarashi e sua equipe.
Tenha um pouco mais de paciência: estamos mais perto do que longe do lançamento |
Pra quem está por fora
dos babados, Bloodstained: Ritual of the Night (até o nome é parecido!) é um
projeto financiado pelo site de arrecadação em massa Kickstarter, uma
iniciativa que permite a fãs financiar um projeto que eles desejem se tornar
realidade com a promessa de algumas vantagens àqueles dispostos a pagar
antecipado por algo que nem sabem como será quando estiver pronto.
A essa altura, você já
deve estar pensando: isso tem um enorme potencial pra dar em merda, com jogos
lixos sendo lançados no lugar de promessas faraônicas e desenvolvedores fugindo
pras Barramas com a grana dos financiadores sem deixar vestígios de sua
passagem na Terra.
Sim, as hipóteses que
eu citei no parágrafo acima, infelizmente, são inspiradas em casos que
aconteceram na vida real. O que não é o caso do Bloodestained: Curse of the
Moon, uma das metas da campanha de Kickstarter de seu irmão mais novo, o Ritual
of the Night. Pra quem está voando, eu explico: o jogo “pra valer” mesmo é o
Ritual, o sucessor espiritual do Symphony.
Zangetsu: "será que eu estou à altura da série clássica?" |
O Curse, uma
declaração de amor aos Castlevania da era 8-bits, era uma das metas (lançar um
jogo bônus em estilo retrô) do Ritual caso ele alcançasse o valor almejado por
Iga e sua trupe. Outras metas incluíam a OST do Ritual composta por Michuru
Yamani (meu motivo de compra futura desse jogo) e outras coisas mais.
Mas então, Curse of
the Moon serve apenas como um aperitivo pra estimular o apetite antes do prato
principal ou é um jogo que caminha e chicoteia com suas pernas (e mãos)
próprias? Ele serve de distração para a chegada do jogo mais aguardado ou tem
personalidade, razão de ser e estilo próprios que justifiquem a compra? É isso
que eu pretendo responder no texto a seguir.
HISTÓRIA (8,7)
Se você conhece os
jogos idealizados por Koji Igarashi, deve bem saber que eles não possuem uma
história, história de fato, e sim mais uma premissa que serve como desculpa pra
jogar e para os elementos de jogabilidade encontrados em seus títulos.
Bloodstained segue nessa mesma linha, então, se você está esperando aqui um
enredo digno de um Bioshock ou um dos pretensiosos games do David Cage, pode ir
tirando o cavalinho da chuva.
Tendo feito esse
esclarecimento, vamos à premissa do jogo: um demônio super forte despertou e
quer tocar o terror do mundo usando e abusando de criaturas da noite enquanto
repousa imponente do alto de seu palácio (demoníaco). Ele quer usar os poderes
da lua para alcançar seus objetivos. Esse é o lado do bandido.
Meu protagonista favorito: o vampiro que tem gosto de Alucard, parece com o Alucard mas não é Alucard... |
Do lado do (s) mocinho
(s), temos um velhote que lança magias, uma mulher que ataca com um chicote, um
vampiro que joga (?!?) morcegos nos inimigos e uma outra mulher samurai que
luta com uma espada. Não, eu não me lembro do nome dos personagens, é por isso
que usei substantivos genéricos pra me referir a eles. Durante o gameplay era
exatamente assim que eu citava os heróis jogáveis do game: a doidinha do
chicote, a samurai, o velho da magia e o Alucard.
Exceto pela mulher
samurai, que eu acabei memorizando seu nome (Zangetsu), pelo fato de ela ser a
protagonista do Ritual of the Night e exercer papel narrativo de extrema
importância no Curse of the Moon, não cheguei a me apegar muito aos
protagonistas. Isso é uma falha do jogo? Não, apenas um reflexo do formato de
jogo em 2D menos duradouro que é típico das produções do titio Iga.
O capeta final do jogo é tenso: prepare to die! |
Voltando ao enredo,
ele se resume a isso mesmo: derrotar o demônio lorde das trevas em seu palácio
com a ajuda dos protagonistas do game. Substitua a palavra “palácio” por “castelo”,
“demônio” por “Drácula” e “protagonistas” por “caçadores de vampiros” e teremos
uma cópia em carbono da estrutura (tanto narrativa quanto de jogabilidade) de
um dos maiores clássicos desse gênero, o Castlevana 3.
Sim, fica impossível
não notar a homenagem e a semelhança entre esses dois games. Até um completo
tapado como eu conseguiu perceber de cara, com a aquisição do segundo herói,
que todo o game seria muito parecido com o que vimos no terceiro episódio da franquia
de vampiros da Konami... exceto pelo fato de que eu NÃO JOGUEI o terceiro
episódio da franquia de vampiros da Konami!
Não fique envergonhado caso se flagre dizendo: Castlevania Curse of the Moon. A semelhança beira a univitelinidade. |
Não ter feito a lição
de casa vai estragar sua experiência com Curse of the Moon? Claro que não,
muito pelo contrário: por ser uma cópia quase exata do Castlevania 3, se você
não conhece este game vai conseguir aproveitar muito melhor o Curse se jogar às
cegas, aceitando-o enquanto o projeto referencial que ele de fato é.
Sobre o enredo em si,
claro que não vou dar detalhes pra não estragar a surpresa de quem pretende
jogar (acredite: TEM sim muita coisa boa guardada na história desse jogo,
apesar de sua estrutura simplória fazer parecer que não). Entretanto, posso dar
o conselho de que o jogador termine o jogo pelo menos no segundo modo de
dificuldade, aquele que jogamos sem a Zangetsu, caso contrário não conseguirá
entender o rumo final que a história toma.
Pra finalizar o
tópico, preciso dizer que o final verdadeiro do game foi um dos mais prazerosos
que eu consegui fazer nos últimos tempos, seja pela batalha final
surpreendente, seja por uma direção de eventos que consegue ao mesmo tempo
instigar sua curiosidade e te deixar com ainda mais vontade de jogar o Ritual
of the Night quando ele for lançado.
GRÁFICOS (8,5) E SOM (6,0)
Diferente de jogos
como Stardew Valley, Curse of the Moon não tenta simular um jogo de gerações
passadas com efeitos modernosos escondidos debaixo de uma máscara de jogo
antigo. Nesse caso, Curse é realmente um jogo feito com um motor gráfico que
realmente se parece com um jogo 8-bits verdadeiramente.
Claro que a quantidade
de efeitos e objetos nos cenários jamais poderia ser realizada num console de
8-bits sem drásticas alterações de hardware, mas o cerne do game é de um puro
jogo de 8-bits em pleno ano de 2018. Isso é muito bom, visto que apenas os fãs
verdadeiros do estilo se dedicarão ao game.
Pra ser sincero, não
consigo imaginar um jogo mais de nicho lançado ano passado que esse aqui: além
de trazer uma experiência de jogabilidade que retrata perfeitamente os jogos da
aurora da indústria, Curse of the Moon é fiel ao visual quase monocromático dos
jogos da década de 70 e 80.
Alguns bosses ocupam, literalmente, a tela inteira! |
Isso se traduz no
estilo gráfico adotado para os heróis, por exemplo: cada um deles é
representado por uma cor primária (roxo pro chicote, vermelho pra Zangetsu,
preto com vermelho pro Alucard e amarelo pro velhinho das magias) que não deixa
dúvidas sobre qual dos heróis você está controlando.
De resto, não tem
muito o que comentar sobre visuais: há chefes que ocupam a tela inteira, e
algumas batalhas contra eles vão trazer uma quantidade de partículas e efeitos
especiais que te darão a certeza de que esse jogo jamais poderia ser possível
de acontecer num console true 8-bits.
Sobre o som,
infelizmente não foi dessa vez. Os efeitos sonoros são bem ok, mas as músicas
não chamaram muito minha atenção. Pra ser sincero, não faço ideia de quem
compôs a OST desse game mas, se foi a Michiru Yamani, não acho que ela estava
em seus dias mais inspirados. Não que as faixas sejam ruins, longe disso, mas
elas não ficam na memória depois que você desliga o console, cumprindo seu papel
apenas in-game (o que já é mais do que muitos jogos conseguem alcançar).
SISTEMA (10,0)
Sim, eu adorei de
paixão a fórmula de troca de personagens que o jogo traz. Eu sei, isso também
foi chupinhado do Castlevania 3, onde jogávamos com Trevor, Grant, Alucard e
Sypha (lembra da série animada da Netflix? Então...). Dessa forma, pra colocar
os bois em seus respectivos cercados: a doidinha roxa do chicote é o Trevor; o
velho amarelo das magias é a Sypha; o vampiro que parece com o Alucard é o...
Alucard; e o Grant... foda-se, quem liga pro Grant?
Sobre as mecânicas de
jogo, elas também foram “homenagens” sem dó do Castle 3: você mata monstros em
uma tela que avança para os lados; coleta poções que caem de candelabros
destruídos; e possui uma barra de vida que vai sendo esgotada ao receber dano,
mas que pode ser recuperada com, vejam só, CORAÇÕES, como sempre devia ter
sido.
Adivinha quem é o único que consegue subir ali em cima? |
O game não é um
Metroidvania no sentido de mapa e exploração, mas há passagens que só podem ser alcançadas com a habilidade de determinados
heróis (como o voo do morcego ou o carrinho da mulher de chicote). Cada um
deles vai utilizar uma arma secundária que serve pra situações de combate
específicas, variando muito de acordo com a movimentação, resistência e força
dos inimigos. Ah, também vale lembrar que é possível trocar de herói a qualquer
momento do game, a menos que ele tenha morrido, claro.
Sobre a dificuldade,
ela é bem alta para os padrões de hoje. Não espere um passeio no parque ao
jogar esse jogo, mas também não fique com receio de jogar achando que ele está
no nível de doença mental de clássicos da filhadaputice como Ninja Gaiden ou
Battletoads: Curse of the Moon é um jogo que vai te desafiar sim, mas na medida
certa a ponto de você se empenhar pra passar dos desafios sem perder o interesse
no game, o que eu acho algo maravilhoso no contexto atual de jogos muito fáceis
como parece ser o da atualidade.
Tem knockback e escadas do capeta pra te jogar no abismo, igualzinho aos jogos clássicos |
Como já adiantei, há
diferentes níveis de dificuldade que revelarão mais do enredo (tem um até que
remove o knockback típico desse gênero), trarão desafios mais emocionantes e
alguns momentos de jogabilidade que eu, particularmente, não esperava ver num
jogo descompromissado desse nível (na boa: não pare de jogar esse jogo antes de
enfrentar o chefe final verdadeiro. Será uma das melhores lutas contra um final
boss que você terá em anos!).
Apesar de ter
atribuído nota máxima ao tópico sistema, ele não deixa de possuir falhas. São bobagens
que não mancham a maestria alcançada pela equipe da Artplay, mas que eu preciso
citar no texto a fim de completude e isenção no julgamento final. Por exemplo,
o chefe da segunda fase, aquele bicho que parece uma tartaruga, é
exageradamente difícil pra um começo de jogo, te fazendo morrer várias vezes até pegar seu macete. Falando
nisso, praticamente tudo nos confrontos do game se resumem a exatamente isto:
macete.
Alguns desafios vão fazer você suar até descobrir o melhor personagem pra cada situação... |
São raras as batalhas
com chefe que abrem uma janela pro jogador improvisar, ou tentar usar um dos
quatro heróis que deseja mesmo sabendo qual é o mais apropriado para a ocasião.
Sendo assim, alguns confrontos são praticamente impossíveis de finalizar se
você já tiver morrido com o personagem requisitado.
Também achei o game um
pouco curto. Eu sei, pode ser apenas o desejo de “quero mais” de um jogador que
experimentou algo novo e gostou do que viu, mas acho que um herói extra ou uma
leva de fases inéditas (se é que não existem nos modos mais difíceis) viria bem
a calhar, já que você fica bastante confiante depois que aprender as
potencialidades e fraquezas de cada personagem.
Fora esses queixumes
forçados pra ter algo a relatar no texto, não tem mais nada do que reclamar do
sistema do Curse of the Moon: é complexo na medida certa, instigando o jogador
a masterizar o uso de cada protagonista e descobrir seus itens e habilidades exclusivas
que podem significar a derrota completa ou a total aniquilação dos chefes de
fase.
LUA DE SANGUE
Parece que 2018 foi o
ano dos jogos indie brilharem: depois de The Sexy Brutale e Stardew Valley
terem me arrebatado completamente com suas qualidades inesperadas, Bloodstained
Curse of the Moon chegou pra dar o golpe de misericórdia no que havia restado
no meu preconceito bobo com jogos independentes de baixo orçamento.
Respondendo às
perguntas feitas no começo do post: não, ele não serve apenas como um aperitivo
pro prato principal que será o aguardadíssimo Ritual of the Night. Esse Bloodstained
caçula, se brincar, pode acabar roubando a cena e atraindo para si todos os
holofotes que deveriam estarem virados na direção de seu irmão maior
(sinceramente, espero que isso jamais aconteça).
NOTA FINAL: 8,3
Sim, ele chicoteia, dá
golpe de espada e arremessa morcegos com suas pernas e mãos próprias, mais que
cumprindo a sua função de nos fazer ansiar o lançamento do Ritual of the Night
em (espero eu) 2019.
O melhor momento do jogo, fácil. |
É um jogo
surpreendentemente bom, desafiador e completo, que vai dar água na boca dos fãs
mais antigos da franquia Castlevania (é o que tem pra hoje, já que a Konami está pouco se
fodendo para essa série nos games) enquanto recruta novos adeptos da saga de
heróis que lutam contra um mal noturno sem fim.
Espero que tenham
gostado do texto e que tenham se surpreendido tanto quanto eu com a qualidade desse
jogo. Confesso que eu comprei o jogo por engano, achando que seria o Ritual of
the Night (se eu passo a impressão de ser inteligente, saiba que eu sou uma
completa besta, às vezes), mas fiquei mais que feliz com minha experiência
final com o game.
Au Revoir!
muiito dificil achar alguem que ainda poste em blogspot, ótimo conteúdo
ResponderExcluirRealmente, blogs são uma espécie em extinção. Agradeço pelo elogio.
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