Hokuto no Ken é uma série
japonesa que provavelmente é receitada em consultórios psiquiátricos àqueles
pacientes que chegam com dúvidas sobre sua própria masculinidade. Datado da
década de 80, a série de anime conta a história de Kenshiro, um japonês de
1,90m de altura e com ombros maiores que a cabeça de um ser humano adulto
saudável. Kenshiro tem a mania de rasgar sua própria camisa (pra exibir um
peitoral anatomicamente impossível) toda vez que alguma pessoa indefesa está sendo
molestada por um meliante e, apesar de falar pouco e não ter muitos amigos, ele
possui um senso de justiça inabalável e não suporta assistir ao sofrimento de
inocentes.
Ah, também tem o pequeno
detalhe de que, nessa história, o mundo foi destruído por bombas nucleares, os
mares secaram e toda a vida do planeta parece ter sumido do mapa (exceto pela
espécie humana), mas te aconselho a não levar a lógica muito em consideração
quando for acompanhar essa série, pro bem da sua própria sanidade mental...
Se você acha que obras
como Dragon Ball Z ou Cavaleiros do Zodíaco são exageradas e trazem absurdos aos
quilos em seus episódios, só pode significar que você não conhece o Punho da
Estrela do Norte, uma das séries mais influentes da cultura pop japonesa. Só pra
te dar uma ideia: além dos animes citados acima, Hokuto no Ken serviu de
inspiração pra milhares de outras fontes das quais provavelmente você não fazia
a menor ideia, como Street Fighter ou... cara, Hokuto no Ken é aquele tipo de
obra que parece permear cada ramo do entretenimento atual de uma forma quase
onipresente, então apenas assista e saia contando as referências que conseguir
localizar nos episódios pra me poupar desse trabalho.
Kenshiro cunhou o termo "poser" quando ninguém fazia ideia do que isso queria dizer. |
Sim, eu sei que a
série se inspira fortemente na franquia Mad Max, e que faz referência visual a
várias figuras famosas da cultura popular mundial (acho que a banda Twisted
Sister deve ter se sentido ou homenageada ou plagiada com a aparência dos punks
e inimigos enfrentados por Kenshiro durante o anime...). Mas Hokuto no Ken
possui toneladas e mais toneladas de bizarrices tipicamente japonesas que nunca veríamos em outro lugar senão o Japão. Por exemplo, o protagonista Kenshiro.
Kenshiro é um
praticamente da arte milenar Hokuto Shinken. E falar das coisas que o
protagonista faz no anime, apenas utilizando essa “técnica”, é como tentar
descrever um canivete suíço pra uma pessoa que não enxerga, não ouve e não
possui tato. Então, só pra dar um gostinho dos milagres que o Hokuto Shinken
opera, basta dizer que Kenshiro consegue, entre outras coisas: explodir
cabeças; quebrar colunas ao meio; imobilizar o inimigo; parar seu coração;
curar cegueira; entortar barras de ferro; parar armas brancas com as mãos; e
muitas outras loucuras das quais não me recordo agora.
Kenshiro e sua técnica
do Honkuto Shinken são praticamente invencíveis. Eu assisti a apenas 14 dos
mais de 100 episódios que a primeira fase do anime possui, mas não é exagero
dizer que o protagonista enfrenta dúzias de oponentes sem sequer ser levemente desafiado nesse meio tempo. Falando assim parece ser algo meio tosco, mas uma das
graças do desenho é assistir as formas de execução que com as quais Kenshiro
vai dar cabo do seu inimigo, antes de proferir uma das mais célebres frases da
história dos desenhos japoneses: Omae wa
mou shindeiru (você já está morto).
Apenas cem cadáveres: um dia de movimento fraco na empresa Kenshiro Corporation... |
Lembra do golpe dos
Cinco Pontos, do Pai Mei (Kill Bill)? Lembra daqueles momentos nos Cavaleiros
do Zodíaco, onde os personagens têm seus corpos perfurados por dedos ou um lutador
abandona a batalha porque seu oponente já foi derrotado e nem se deu conta
disso? Então, todas essas tosqueiras da narrativa japonesa já podiam ser
encontradas desde 1983, em Hokuto no Ken.
Então, dada a fama e
influência deste... peculiar anime, nada mais óbvio que a franquia ganhar
várias versões para videogames de todas as eras possíveis e imagináveis. Claro que
eu não vou listar aqui cada aparição dos trapézios plus size de Kenshiro nos games, então só posso adiantar que o texto abordará a minha experiência com o
único game da franquia o qual eu tive o (des) prazer de experimentar, o Fist of
North Star: Ken’s Rage.
Sem mais enrolação,
vamos aos motivos que me fizeram desistir de jogar o Punho da Estrela do Norte,
lançado em 2010 para Playstation 3 e Xbox 360, ainda nos primeiros 20 minutos
de gameplay.
A GUERRA NUNCA MUDA...
Em 2009, ao menos no
Playstation 3, eu já jogava games com visuais maravilhosos de pelo menos um ano
de idade. Entre esses, posso citar Resident Evil 5, Dead Space, Bioshock e
Street Fighter 4. Então, o que devemos esperar de um jogo de 2010 com mecânicas
simples de gameplay e cenários em linha reta lotados de paredes invisíveis? Nada
mais que um deslumbre visual, concorda? Isso é tudo que este jogo NÃO vai entregar...
O tutorial e o modo
história são praticamente a mesma coisa: Kenshiro andando lentamente (e batendo
lentamente também) por corredores lineares enquanto enfrenta hordas de
meliantes genéricos que passam o tempo brincando de upa-upa cavalinho com camponeses
indefesos. Se a repetição dos combates fosse regada a lutas divertidas, bem-ilustradas e à altura do gore do desenho, eu ficava calado. Mas não é o que
acontece.
Quando não estiver
assistindo, pela décima vez, o desabar de uma coluna de pedras que barrava o
caminho de Ken, o jogador provavelmente vai estar desviando de uma parede
invisível ou tentando ajustar a câmera pra enquadrar o ângulo certo. Os cenários,
além de lineares, são feios e repetitivos: boa sorte ao tentar discernir
montanhas de escombros de uma carcaça de caminhão destruído.
Kenshiro é tão lento que leva horas pra derrotar o chefe do tutorial. |
Ken, por sua vez,
conta com "lindas" estrias em baixa resolução que não condizem com a anatomia de
um cara que possui mais músculos no corpo do que a biologia permite, visual
pobre esse que torna os combates de beat’em up pouco interessantes e
desmotivantes de se assistir (e se executar). Os oponentes, ao serem mortos,
flutuam no ar com uma ridícula cabeça de balão que deveria representar aqueles
momentos legais no anime, onde crânios explodem sem a menores preocupações com
faixa etária.
Ainda na parte dos
visuais, em apenas 20 minutos de jogo (foi o máximo que a minha fisiologia de adulto
de 35 anos conseguiu suportar) eu consegui encontrar um erro de tradução
grotesco, digno de quem não faz ideia do material fonte com o qual está
trabalhando: Bart, o garoto mau
caráter e pentelho que só pensa no próprio bem-estar, virou Bat, o menino-morcego. Se por cegueira
ou tentativa de adaptação eu não sei, mas esse tipo de amadorismo faz com que
um produto de baixa qualidade caia ainda mais no meu conceito quando eu me
deparo com um game desconhecido.
Você não faz ideia da demora que leva pra Ken agarrar um oponente nesse jogo. E os efeitos de resolução 4K são de fazer chorar... |
A parte sonora do game
é praticamente uma “Ivete Sangalo no Rock in Rio”: alguns diálogos são
extremamente baixos, antecipados por um grito súbito que vai diminuindo de
volume conforme a linha de conversação progride. É possível escolher o áudio
original japonês com legendas em inglês, o que eu sinceramente duvido que vá
melhorar em alguma coisa sua (má) experiência com o jogo. Em outros trechos,
parece que estamos jogando um game sobre cinema mudo. As razões para tal
comentário são autoexplicativas...
Quando não está te
enervando com diálogos quase inaudíveis, Hokuto No Ken está enchendo seu saco
com um rock genérico, durante os combates, capaz de deixar entediado até o aborrescente
mais fã de Slipknot. Pra piorar, o ritmo lento das batalhas simplesmente não
condiz com as faixas tocadas, sendo que na pausa e em outros momentos o jogo
toca temas, como nos jogos da série Fallout, que quebram totalmente a
identidade musical planejada para o jogo.
SEU CÉREBRO JÁ ESTÁ MORTO E VOCÊ NEM PERCEBEU...
É incrível como um
jogo consegue reunir tantos problemas e baixa qualidade logo em seus primeiros
20 minutos. Falando do ponto de vista de colecionador, Hokuto no Ken é o típico
jogo que você adquire apenas pelo seu valor como raridade, destoando de
surpresas mais que bem-vindas (como Afrika ou Majin and the Forsaken Kingdom)
que te despertam a alegria de desenterrar joias raras do console para o qual
você decidiu colecionar.
É um jogo extremamente
repetitivo, linear e com combates sem graça, que não fazem jus à fodice do
protagonista do anime e ainda consegue fazer o jogador desistir de achar que é
possível adaptar uma obra com fidelidade de forma que ele não queira se
suicidar de tédio logo depois que a introdução do jogo terminar.
Fist of the North
Star: Ken’s Rage possui uma continuação, que eu ainda não adquiri pra minha
coleção. Se seguir a mesma linha do primeiro, já sei o que fazer: testar o
disco por dez minutos, pra ver se o vendedor não me passou gato-por-lebre; higienizar a caixa e o manual do game e engavetar o título apenas pra engordar as
fileiras da minha coleção. Pelo visto, a franquia Hokuto no Ken segue a mesma
linha de séries como Gundam ou Dinasty Warriors: são jogos extremamente
repetitivos, que exigem do jogador que ele desligue seu cérebro e coloque o dedo polegar no piloto automático, apertando o botão de ação até que todos os
inimigos caiam. No desenho, que não requer interatividade, isso pode ser
divertido, acredite. Já em um jogo...
Au Revoir.
Obrigado pela materia!
ResponderExcluirisso é bem comum estragarem a historia de classicos nos games !